Para quem pensa cometer um suicídio sem dor, alertamos que o suicida não o fará sem dor, muita dor.

domingo, 18 de julho de 2010

CIRCUSTÂNCIAS REFLEXAS E SUICÍDIO

Waldehir Bezerra de Almeida





Os problemas acompanham o suicida no além-túmulo.



O suicídio, para muitos estudiosos do assunto, está ligado ao campo social e à psicopatologia e estabelecem, como principais causas a ausência de uma perspectiva de vida, impossibilidade de automanutenção, criminalidade, chantagem, vingança, transtornos de humor (depressão, pânico, ansiedade generalizada etc.), consumo abusivo de drogas e álcool. Quando os suicidas deixam cartas justificando seu ato tresloucado, falam de incredulidade nos homens e em Deus, desânimo para enfrentar os desafios da vida e sua falta de sentido, frustração no amor.



O sociólogo Émile Durkheim (1858-1917), estudando os problemas da personalidade, admitiu que o suicídio tem fundamentos em causas sociais e não individuais. Com base em suas pesquisas, caracterizou três tipos de suicidas:



a) suicida egoísta: aquele que se afasta dos outros seres humanos;

b) suicida altruísta: aquela pessoa que se mata por extrema lealdade a uma causa;

c) suicida anômico: aquele para o qual as crenças e os valores sociais perderam todo o sentido.



Não obstante o valor reconhecido das causas acima apontadas, elas não são suficientes para esclarecer plenamente as razões que levam a criatura a interromper sua existência física em ato de total desobediência ao Criador, pois que uma grande parte dos seres humanos que passa por aquelas circunstâncias não comete o suicídio. Professor Allan Kardec interpelou os Espíritos querendo saber de onde nasce o desgosto da vida conduzindo o homem ao suicídio e obteve a seguinte resposta:



- "Efeito da ociosidade, da falta de fé e, também, da saciedade. Para aquele que usa de suas faculdades com fim útil e de acordo com as suas aptidões naturais, o trabalho nada tem de árido e a vida se escoa mais rapidamente. Ele lhe suporta as vicissitudes com tanto mais paciência e resignação, quanto obra com o fito da felicidade mais sólida e mais durável que o espera."1 E o Codificador complementa com a sua sabedoria haurida nas fontes espirituais superiores: "A incredulidade, a simples dúvida sobre o futuro, as idéias materialistas, numa palavra, são os maiores incitantes ao suicídio; ocasionam a covardia moral."2.



Pode-se afirmar, portanto, que a principal causa que leva o homem a cometer tal desatino é o materialismo que faz o homem acreditar que a vida se resume nesta existência, e que sua dor, seja ela física ou moral, cessará com a morte do corpo. O que não é verdade, pois o sofrimento continua no Além-túmulo em forma de tortura.

O Espiritismo, comprovando que o Espírito vive muitas existências pela reencarnação, tem a resposta para muitos desses acontecimentos, estando entre eles a reincidência no auto-aniquilamento, acovardando-se diante da prova que pedira antes de reencarnar. Analisando esse caso, o Mentor Druso cunhou a expressão circunstâncias reflexas para esclarecer que existem situações em que o Espírito no seu processo provacional é tentado a repetir o mesmo erro de outrora. Permita-me o leitor dar aqui alguns esclarecimentos antes de ouvirmos aquele Mentor.

Circunstância é condição de tempo, lugar ou modo que cerca ou acompanha um fato ou uma situação e que lhes é essencial à natureza. É um conjunto de fatores materiais, morais e espirituais que acompanham ou circundam alguém em um determinado momento. Costuma-se dizer que "a ocasião faz o ladrão". Essa ocasião é a circunstância que incita o homem a cometer o furto. Sendo ele moralmente fraco, o cometerá.

Ação reflexa é uma resposta mecânica - involuntária - uniforme e adaptada, do organismo a um estimulo externo ou interno ao próprio organismo. Exemplos: a contração da pupila quando o olho é estimulado pela luz ou a salivação pelo gosto ou pela vista de um alimento. Assim também funciona o nosso psiquismo reagindo positiva ou negativamente frente a um agente indutor. André Luiz cita vários exemplos de agentes da indução que nos levam, muitas vezes a uma ação reflexa: "Uma conversação, essa ou aquela leitura a contemplação de um quadro, a idéia voltada para certo assunto, um espetáculo artístico, uma visita efetuada ou recebida, um conselho ou uma opinião representam agentes de indução, que variam segundo a natureza que lhes é característica, com resultados tanto mais amplos quanto maior se nos faça a fixação mental ao redor deles."3

A circunstância reflexa poderá ser o próprio meio onde o Espírito reencarnou para ser provado na sua má tendência. Ensina Kardec ser necessário que o Espírito ao reencarnar "[...] seja posto num meio onde possa sofrer a prova que pediu. Pois bem! É necessário que haja analogia. Para lutar contra o instinto do roubo, preciso é que se ache em contacto com gente dada à prática de roubar."4

Mas tal circunstância poderá surgir a qualquer momento da nossa nova existência provacional. Tudo estará indo muito bem na vida da criatura, quando, de repente, se encontra ela em meio a uma situação inesperada, contrária a tudo o que até então previra ... É circunstância reflexa a exigir-lhe renúncia, resignação, fé em Deus e paciência ... É o momento da prova máxima que o Espírito na ânsia na¬tural da libertação da consciência solicitou à Misericórdia Divina. Acompanhemos, agora, em resumo, o raciocínio do Mentor Druso.

Um homem comete suicídio aos quarenta anos de idade no corpo físico. Retomando ao mundo espiritual sofre as conseqüências imediatas do seu gesto. Para recompor as células do veículo perispiritual, recebe o prêmio de um corpo carnal devendo passar pela prova extrema da tentação ao suicídio na idade precisa em que o cometera na outra existência. Isso porque - conclui Druso - "[...] as imagens destrutivas, que arquivou em sua mente, se desdobrarão, diante dele, através do fenômeno a que podemos chamar "circunstâncias reflexas", dando azo a recônditos desequilíbrios emocionais que o situarão, logicamente, em contacto com as forças desequilibradas que se lhe ajustam ao temporário modo de ser."5

Diante do que foi dito, não se deve compreender que o Supremo Criador, com sua Lei inexorável, impõe como expiação ao pecador o cometimento do suicídio por ele ter assim agido em outra vida ou ter sido co-responsável pelo suicídio de outrem. Não! Tudo transcorre por efeito lógico de uma causa criada pelo delinqüente à revelia da Lei harmoniosa que rege o Universo. O Espírito que cometera suicídio em outra existência, chega nesta desarmonizado com as Leis divinas, enredado em complexos psíquicos deprimentes e, para se redimir, deverá suportar a tentação da reincidência.

É oportuno lembrar o "não nos deixeis cair em tentações" que Jesus nos pede para repetir na oração Pai Nosso, bem como a imperiosa necessidade de não darmos trégua à nossa reforma íntima, amealhando recursos educativos e renovadores, com ajuda do estudo das coisas divinas e pela prática da fraternidade. Assim, melhores preparados do que chegamos à Terra, com a misericórdia de um novo corpo, estaremos aptos a superar a crise trazida pelas circunstâncias reflexas, não somente para vencer o incitamento ao suicídio, mas também a outros atos contrários às Leis Morais Divinas, que levarão ao encarceramento de nossa consciência.



1 - KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 76. Ed. Rio de Janeiro - RJ: FEB, questão 943. 2 - KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 112. Ed. Rio de janeiro - RJ, capo V, item 16.

3 - XAVIER, Francisco Cândido/VIEIRA, Waldo. Mecanismos da mediunidade. Pelo Espírito André Luiz. 1. ed. especial, Rio de Janeiro - RJ: FEB, 2003, capo 12, p. 92.

4 - KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Edição eletrônica da FEB, questão 260.

5 - XAVIER, Francisco Cândido. Ação e Reação. Pelo Espírito André Luiz. 1. ed. especial, Rio de Janeiro - RJ: FEB, 2003, p. 98-99.



Nota: o autor é professor aposentado e atua no movimento espírita de Brasília-DF.





Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo - Outubro de 2006

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