quarta-feira, 28 de julho de 2010

Porque os homens nos matam

Lya Luft




Não tenho a menor tolerância com a figura do pai e marido boçal, que usa o stress no trabalho como desculpa para gritar ou distribuir bofetões em casa. Nunca vi nem escutei um homem batendo numa mulher. Mas histórias a respeito, ah, muitas pululavam em comentários dos adultos, e nas minhas fantasias de criança com excesso de imaginação, que aumentava encantos e pavores.



Relatos como o do homem que regularmente se embebedava e batia na mulher, os dois já de cabelos brancos. Os vizinhos incomodados às vezes reclamavam, mas todos tinham medo dele e, afinal “a gente não quer se meter”. Os filhos adolescentes do casal se refugiavam no fundo do pátio, os menorzinhos choravam. Até que um dia um deles, crescido, se meteu entre os dois velhos, e disse: “Na minha mãe você não bate mais. Ou eu te bato também”. Minha memória diz que o rapaz foi expulso de casa e nunca mais o viram. A mãe recebeu disfarçados parabéns quando, tempos depois, o velho cruel morreu, mas comentava-se que estava abalada. Porque “mulheres são assim”. Será?



Por que uma mulher aceita apanhar do parceiro ou ser humilhada por ele, controlada, ironizada? Por que admite ser tratada com grosseria pelo filho homem? O que deixou em nós, as remanescentes das cavernas, essa marca feia e triste, essa deformidade que cola com a deformidade do ex-troglodita às vezes assassino? É um dos mistérios humanos, nem todos engraçados ou curiosos, que talvez nunca se expliquem.



Não sei por que a brutalidade masculina e a submissão feminina fariam parte de nossa estrutura psíquica ou de qualquer cultura. Mas não desconheço a ideia de que o homem se cansa em trabalho sério, e a mulher se distrai em casa com as crianças e as lides domésticas, às vezes, quem sabe, com um empreguinho “fora” - sem direito a stress. A esta altura, matam-se no Brasil cerca de dez a doze mulheres por dia. Não morte por assalto ou acidente de carro: assassinato na mão do parceiro. Em certos lugares a exp0licação para os maus-tratos é simplória: “Os homens são assim”, e pronto. Ou: “Mas ele não te deixa faltar nada” - significando trapos para se cobrir, restos para comer temperados com lágrimas e solidão.



Para haver um opressor, dizemos, é preciso haver um oprimido. A mulher-vítima é quem dá coragem ao truculento. O jogo sadomasoquista funciona quando há pelo menos dois parceiros. Por que tantas vezes essa parceria mortal? A maioria dos homens não é psicopata nem boçal. Não se alegra na dor da parceira, não precisa lhe bater com palavras, atitudes ou punho fechado para se sentir mais homem.



O que leva uma jovenzinha aceitar, no começo ou no meio de uma relação, a brutalidade masculina, numa frequência absurda? Cresceu em 90% nos últimos tempos o número de mulheres que pedem socorro, no país inteiro, nas delegacias da mulher ou grupos afins. Porém, esses locais são insuficientes ou mal equipados, faltam funcionários, psicólogos, médicos, juízes, computadores. As famílias nem sempre ajudam; amigos não querem interferir; a lei é vaga ou descumprida. A sociedade omissa desvia o rosto.



Enquanto os pedidos de ajuda se multiplicam, as vítimas já tendo coragem de se queixar, querendo recuperar sua dignidade ou salvar sua vida, a espera é tão longa e a punição tão branda que o facínora realiza seu desejo animal: matar a indefesa. O pavoroso fim de mais uma jovem por estes dias, que horroriza, comove e assusta o país inteiro e chega ao exterior, destaca em nosso cotidiano de crueldade e medo o fato vergonhoso de ainda sermos massacradas, humilhadas, muitas vezes mortas pelas mãos dos nossos homens. E, se é assim, junto com tantos milhares de pessoas que querem ver o fim disso, eu proponho: enquanto indivíduos, vamos ficar atentos, vamos denunciar, ajudar, vamos agir. Enquanto sociedade, vamos prevenir, impor leis severas, e socorrer as vítimas – tirando dos brutos e psicopatas seu reinado de horror.



Lya Luft é escritora



Revista VEJA, 21 de julho de 2010

terça-feira, 27 de julho de 2010

Sinais avisam que o amado pode virar algoz, afirmam especialistas

RENATA RODE

Colaboração para o UOL

Estima-se que mais de 2 milhões de mulheres são espancadas a cada ano por maridos ou namorados, atuais ou antigos



Dependência econômica impede que vítimas deixem parceiros violentos, diz estudo"Taty, eu amo o Rodrigo, sei que ele me bate porque tenho alguma culpa nisso tudo." Esse é um trecho do e-mail enviado pela médica paulista Glaucianne Hara, dias antes de sua morte. Ela conversava com sua psicanalista e amiga, Tatiana Ades, sobre o relacionamento que mantinha com o marceneiro gaúcho Rodrigo Fraga da Silva, assassino confesso da parceira.



A médica paulista Glaucianne Hara foi morta dia 5 de junho a facadas em frente ao hotel Bauer, na cidade de Torres, no litoral norte do Rio Grande Sul. O marceneiro Rodrigo Fraga da Silva se apresentou à polícia e assumiu a autoria do crime. Ele é casado e mantinha com a vítima um relacionamento conturbado havia três anos.



A frase do início do texto resume a história recorrente de mulheres que se envolvem em relacionamentos suicidas, vivem dias de terror e até têm a vida interrompida por tal decisão. A mídia tem relatado também os casos da advogada Mércia Nakashima e da modelo Eliza Samudio e a pergunta que fica no ar é: há como prever um ato de tamanha violência por comportamentos ou atitudes do companheiro?



Estou te ligando para dizer que dessa vez acabou, acabo de sair de um coma... Ele me chutou e me bateu tanto que fiquei em coma e perdi os movimentos de uma perna. Quero me dedicar aos meus filhos pequenos, agora basta", diz Glaucianne à amiga. E duas semanas depois, o discurso muda: "A verdade é que não consigo, vou atrás dele de novo, ele deve ter tido motivos para fazer o que fez...

Sim, segundo a psicanalista Tatiana Ades, autora do livro “Hades - Homens que Amam Demais” (Editora Isis), que, depois de ouvir tantos casos em consultório e sofrer a perda da amiga Glaucianne dias atrás, comanda um movimento de consciência feminina contra a violência. “Centenas de mulheres morrem por causa de amor patológico, seja porque se matam, seja porque se envolvem com sociopatas. É o que chamo de cegueira emocional: uma codependência que promove a incapacidade de lidar com o outro de forma saudável. Quem vê de fora tem a sensação de que a mulher é ‘burra’, mas o fato principal é que essa ‘burrice emocional’ é uma doença, e o sofrimento é enorme”, explica a especialista.



Alertas



No caso específico da médica assassinada, a psicanalista aponta vários fatores que servem como alerta de que algo não vai bem. “A velha história de que quem fala não faz é pura mentira. O homem dá diversos sinais verbais de que poderá cometer um crime passional ou uma futura agressão física. O simples fato de dizer que irá fazer já é uma ameaça e uma coação, uma forma de intimidar e chantagear a vítima, deixando-a assustada. Essa é uma das características de homens frios, dominadores, narcisistas e, muitas vezes, sociopatas”, afirma Tatiana.



Os números da violência contra a mulher são alarmantes. No Brasil, uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo revela que a cada 15 segundos uma mulher é agredida. Estima-se que mais de 2 milhões de mulheres são espancadas a cada ano por maridos ou namorados, atuais ou antigos.



Os especialistas advertem que pequenas atitudes denunciam um gráfico crescente de agressão dentro de uma relacionamento. O homem que começa a gritar ou a xingar a companheira certamente no futuro pode machucá-la fisicamente. “Se um tapa vier, esteja certa de que muitos outros o seguirão. Qualquer tipo de agressão serve de alarme, porém o que acontece é que a própria mulher, cega pela paixão, quer justificar os atos - mesmo que errados - do seu amado”, diz Tatiana.



Toda forma de controle exacerbado sobre o comportamento do outro é uma expressão de violência. Nas relações entre casais, o controle de ligações telefônicas, correspondências por e-mail, horários e vestuário pode ser o estopim da violência a partir do momento em que a mulher não aceita mais isso



Wania Pasinato, socióloga e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USPEm São Paulo, quase 60% dos homicídios são cometidos por pessoas sem histórico criminal e por motivos fúteis. A socióloga e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo), Wania Pasinato, acredita que a violência contra a mulher ganhou grande expressão pública principalmente depois da Lei Maria da Penha, instituída em 2006. “Hoje, diversas campanhas procuram estimular mulheres a procurarem as instituições. É preciso ter consciência de que esse é um problema público, de políticas públicas”, declara.



É necessário apontar que a violência contra a mulher não aumentou necessariamente. A mídia dá destaque a alguns casos porque envolvem pessoas famosas ou porque os crimes têm requintes de crueldade, mas a verdade é que a violência sempre existiu. Mas, em um país de cultura machista, o fato não ganhou destaque durante muito tempo. Além desse cenário cultural, há outro fato que contribui para a violência contra a mulher: o vínculo amoroso. “Nós estamos falando de violências que ocorrem no interior de relacões afetivas. Essas mulheres foram agredidas por homens que elas nutriam sentimentos, por quem elas queriam de alguma forma em suas vidas e, quando se veem um relacionamento dessa natureza, não conseguem enxergar a necessidade de escape da situação”, analisa Wania.



Sem contar que muitas mulheres veem a violência como uma expressão de amor, já que existem diversos tipos de violência: a do controle, a do ciúme, a da posse. “Esse pensamento cria amarras para que elas permaneçam nesse tipo de relacionamento. Sair disso não é uma decisão fácil e, às vezes, é algo praticamente impossível para a mulher”, diz Wania. Ela ainda lembra que é fácil deslizar nesse campo e acusar a mulher por ter feito tal escolha. “Não podemos penalizá-la por ter tido esse comportamento porque ela vai atrás do que acredita. A própria Eliza estava cobrando um direito que ela tinha, do reconhecimento de paternidade de um filho que ela não fez sozinha”, afirma.



Ajuda online



Rejeitadora ou rejeitada, quase sempre é a mulher que leva a pior, por isso vou ficar rouco de tanto repetir: afastem-se do agressor



José Geraldo em sua comunidade no OrkutPensando em melhorar o quadro caótico da violência, José Geraldo da Silva, recepcionista de um fórum de São Paulo, resolveu criar, em 2005, a comunidade “Contra Violência à Mulher” no Orkut. Hoje, mais de 52 mil pessoas trocam experiências, desabafos e conselhos por intermédio dessa ferramenta. “Depois de ouvir dia a dia queixas e relatos de mulheres que sofriam nas mãos de seus companheiros, decidi fazer minha parte promovendo informações e trocas de experiências na rede social. Sou da época em que, quando o homem batia na mulher, ele pagava com cestas básicas. Hoje, com a Lei Maria da Penha, o quadro melhorou um pouco, mas ainda não é o ideal, pois o problema é cultural dos dois lados: é comum o homem agredir a mulher e é normal ela aceitar a agressão”, afirma José. E complementa: “Na minha rotina, acompanho casos de mulheres que partem para a denúncia só depois da agressão número 30”.

SUICIDAR-SE, NUNCA!

Orson Peter Carrara





Meu caro leitor, se você é daquelas pessoas que está enfrentando difícil fase de sua existência, com escassez de recursos financeiros, enfermidades ou complexos desafios pessoais (na vida familiar ou não) e está se sentindo muito abatido, gostaria de convidá-lo a uma grave reflexão.

Todos temos visto a ocorrência triste e dramática daqueles que se lançam ao suicídio, das mais variadas formas. A idéia infeliz surge, é alimentada pelo agravamento dos problemas do cotidiano e concretiza-se no ato infeliz do auto-extermínio.

Diante de possíveis angústias e estados depressivos, não há outro remédio senão a calma, a paciência e a confiança na vida, que sempre nos reserva o melhor ou o que temos necessidade de enfrentar para aprender. Ações precipitadas, suicídios e atos insanos são praticados devido ao desespero que atinge muitas pessoas que não conseguem enxergar os benefícios que as cercam de todos os lados.

Mas é interessante ressaltar que estes estados de alma, de desalento, de angústias, de atribulações de toda ordem, não são casos isolados. Eles integram a vida humana. Milhões de pessoas, em todo mundo, lutam com esses enigmas como alunos que quebram a cabeça tentando resolver exercícios de física ou matemática. Mas até uma criança sabe que o problema que parece insolúvel não se resolverá rasgando o caderno e fugindo da sala de aula.

Sim, a comparação é notável. Destruir o próprio corpo, a própria vida, como aparente solução é uma decisão absurda. Vejamos os problemas como autênticos desafios de aprendizado, nunca como castigos ou questões insuperáveis. Tudo tem uma solução, ainda que difícil ou demorada.

O fato, porém, é que precisamos sempre resistir aos embates do cotidiano com muita coragem e determinação. Viver é algo extraordinário. Tudo, mas tudo mesmo, passa. Para que entregar-se ao desespero? Há razões de sobra para sorrir, rir e viver!

O suicídio é um dos maiores equívocos humanos, para não dizer o maior. A pessoa sente-se pressionada por uma quantidade variável de desafios, que julga serem problemas sem solução, e precipita-se na ilusão da morte. Sim, ilusão, porque ninguém consegue auto-exterminar-se. E o suicídio agrava as dificuldades porque aí a pessoa sente o corpo inanimado, cuja decomposição experimenta com os horrores próprios, pressionada agora pelo arrependimento, pelo remorso, sem possibilidade de retorno imediato para refazer a própria vida. Em meio a dores morais intensas, com as sensações físicas próprias, sentindo ainda a angústia dos seres queridos que com ele conviviam, o suicida torna-se um indigente do além.

Como? Sim, apenas conseqüências do ato extremo, nunca castigo. Isto tudo por uma razão muito simples: não somos o corpo, estamos no corpo. Somos espíritos reencarnados, imortais. E a vida nunca cessa, ela continua objetivando o aprimoramento moral e intelectual de todos os filhos de Deus. Suicidar-se é ilusão. Os desafios existenciais surgem exatamente para promover o progresso, convidando à conquista de virtudes e o desenvolvimento da inteligência. A oportunidade de viver e aprender é muito rica para ser desprezada. E quando alguém a descarta, surgem conseqüências naturais: o sofrimento físico, pela auto-agressão e o sofrimento moral do arrependimento e da perda de oportunidades. Muitos talvez, poderão perguntar-se: Mas de onde vem essas informações?

A Revelação Espírita trouxe essas informações. São os próprios espíritos que trouxeram as descrições do estado que se encontram depois da morte. Entre eles, também os suicidas descrevem os sofrimentos físicos e morais que experimentam. Sim porque sendo patrimônio concedido por Deus, a vida interrompida por vontade própria é transgressão à sua Lei de Amor. Como uma criança pequena que teima em não ouvir os pais e coloca os dedos na tomada elétrica.

Para os suicídios há atenuantes e agravantes, mas sempre com conseqüências dolorosas e que vão requerer longo tempo de recuperação. Deus, que é Pai bondoso e misericordioso, jamais abandona seus filhos e concede-lhes sempre novas oportunidades. Aí surge a reencarnação como caminho reparador, em existências difíceis que apresentam os sintomas e aparências do ato extremo do suicídio. Há que se pensar nos familiares, cônjuges, pais e filhos, na dor que experimentam diante do suicídio do ser querido. Há que se pensar no arrependimento inevitável que virá. Há que se ponderar no desprezo endereçado à vida. Há, mais ainda, que se buscar na confiança em Deus, na coragem, na prece sincera, nos amigos (especialmente o maior deles, Jesus), a força que se precisa para vencer quaisquer idéias que sugiram o auto-extermínio.

Meu amigo, minha amiga, pense no tesouro que é tua vida, de tua família! Jamais te deixes enganar pela ilusão do suicídio. Viva! Viva intensamente! Com alegria! Que não te perturbe nem a dificuldade, nem a enfermidade, nem a carência material. Confie, meu caro, e prossiga!

PREVENÇÃO CONTRA O SUICÍDIO

Valentim Lorenzetti





Espalham-se, atualmente, por todo o mundo, os chamados "centros-de-socorro-telefônico", destinados a dar apoio às pessoas desesperadas prestes a se suicidar. 0 trabalho pioneiro nesse setor de atividade teve início há quase vinte anos, na Inglaterra, liderado por um ministro da Igreja Anglicana, o rev. Chad Varah.

A história do primeiro centro-de-socorro-telefônico do mundo e a luta do i rev.Chad Varah, merecem ser conhecidas. Logo após o término da segunda guerra mundial, crescia espantosamente o número de suicídios na Inglaterra. Chad Varah, impressionado com essa trágica estatística, resolveu arregaçar as mangas e instituir um serviço que pudesse dar apoio moral e calor humano às pessoas desesperadas. Expôs seus planos a seus superiores hierárquicos, e estes lhe concederam, para instalar o centro de atendimento, uma velha igreja (de Santo Estevão), parcialmente destruída pelos bombardeios.

As paredes fendidas do velho templo não assustaram o reverendo. Os porões da igreja estavam praticamente intactos e, ali, decidiu ele começar o seu trabalho, instalando o que denominou "Os Samaritanos" Após estafante trabalho de arrumação no local, remoção dos escombros e higienização do ambiente, Chad Varah decide solicitar à companhia telefônica a concessão de um número de Fácil memorização para ser instalado na sede do plantão. Levanta do gancho o telefone empoeirado pelos bombardeios e chama a telefonista a quem expôs seus objetivos. Resposta do outro lado da linha:



"Sim, nós poderemos verificar o que é possível fazer. Por favor, dê-me o número de seu telefone. Nós o avisaremos assim que tivermos uma resposta".

Chad Varah limpa a poeira com a manga da sotaina, e descobre o número do telefone da igreja de Santo Estevão. Nesse instante a emoção lhe embarga a voz. Mesmo assim consegue dizer à telefonista

Começou, assim, com grande emoção, a funcionar o primeiro telefone de atendimento a desesperados de viver, no mundo: É até hoje conhecido e muito atuante "Mansion House 9000 - telefone da amizade". E Londres toda foi inundada por cartazes anunciando o funcionamento de "Os Samaritanos" ; atualmente, a organização está com filiais em vários outros bairros londrinos e em algumas das cidades mais importantes da Inglaterra. Chad Varah, o simpático ministro anglicano, continua à frente dos trabalhos. Seus plantonistas voluntários atendem por telefone e pessoalmente, iniciando geralmente o contato com o suicida em potencial por telefone e terminando com um "tête-à-tête" no plantão da organização. Inspirados nos "Samaritanos", surgiram a seguir outros centros de prevenção ao suicídio. Logo a seguir, por exemplo, os franceses fundaram, em Paris, o "SOS 1 " Amitié, que hoje tem ramificações por toda a França, atendendo somente por telefone e jamais fornecendo o endereço a quem quer que seja. É também integrado por voluntários.



NO BRASIL



Quando, há quase dez anos, o eng. Jacques Conchon, expôs em Londres, ao rev. Chad Varah, o sistema de funcionamento do recém-fundado "CVV - Centro de Valorização da Vida", o ministro anglicano afirmou:



"Veja, meu amigo, vocês lá no Brasil e nós, aqui na Inglaterra, sem nos conhecermos, pertencemos a um trabalho que funciona em moldes idênticos. Até parece que, ao fazer as normas do CVV, vocês usaram um papel-carbono sob as normas de trabalho de "Os Samaritanos Fica, assim, mais uma vez, comprovada a atuação do Alto unindo os homens em torno dos trabalhos de assistência ao próximo. Continuem com a tarefa. Deus saberá recompensar todos os sacrifícios".



E, daquele encontro até hoje, o CVV não deixou de funcionar. Os sacrifícios, os obstáculos, vão sendo vencidos aos poucos. Existindo há quase 10 anos como personalidade jurídica, o "Centro de Valorização da Vida", de São Paulo, é hoje uma entidade de Utilidade Pública Municipal e registrada em todos os órgãos de assistência médica e social do Estado e do País. Atualmente funciona em sede própria, à rua Francisca Miquelina 323, conj. 24, atendendo diariamente, inclusive domingos e feriados, pelo telefone 33.2050, das 16 às 22 horas. Não foi possível, ainda, ampliar a faixa de atendimento do plantão, por falta de pessoal habilitado, que deve .ser necessariamente espírita e voluntário; nenhum elemento do CVV é remunerado a partir dos membros de sua diretoria. 0 período das 16 às 22 horas, em que funciona o plantão, foi estabelecido consultando-se as estatísticas de suicídio e tentativas na capital de São Paulo: é a faixa onde ocorre maior número de suicídios.

Atualmente, o CVV está empenhado na construção da "Clínica de Repouso Francisca Júlia", para doentes mentais sem recursos, cuja primeira fase está sendo concluída. A Clínica localiza-se no bairro do Torrão de ouro, município de São José dos Campos,. nas margens da estrada que leva á Caraguatatuba 0 projeto final da obra é para 400 leitos; a primeira fase comportará 40 leitos. Destina-se a Clínica, a atender á pequena porcentagem (10%) de suicidas em potencial que são doentes mentais e, também, a atender a doentes mentais sem recursos do Vale do Paraíba. Será o primeiro sanatório do mundo especializado no tratamento de doentes mentais suicidas em potencial.

0 CVV é mantido pela, contribuição de associados, que, atualmente, estão se filiando em torno de um montepio - o "Montepio da Valorização", autorizado pelo Governo Federal pelo qual cada associado passa a colaborar com a mensalidade de Cr$ 14,00, e, automaticamente a formar um pecúlio para seus de dependentes, após sua morte. Trata-se de uma forma de arrecadação de fundos, que, a médio e longo prazo, deverá transformar-se no sustentáculo financeiro da instituição, e, principalmente, da "Clínica de Repouso Francisca Júlia". Atualmente a entidade luta ainda com grandes dificuldades financeiras, empenhando-se todos seus plantonistas em campanhas de arrecadação para conclusão do sanatório, onde, até fins de agosto de 1971, a entidade já havia investido quase 300 mil cruzeiros. Dessa importância, o governo do Estado colaborara somente com 35 mil cruzeiros.



RESULTADOS



Desde que começou a funcionar, em caráter experimental, até hoje, o CVV já atendeu a quase duas mil pessoas que estavam realmente dispostas a se matar. Destas infelizmente, quatro se suicidaram realmente, não tendo sido possível ao CVV recuperá-las para a vida. Entretanto, o índice de recuperação é considerado excelente pelos dirigentes da entidade, o que os anima a prosseguir na luta apesar das enormes dificuldades

Em princípios de 1971, a entidade lançou uma ramificação em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, entregando a responsabilidade do funcionamento da filial gaúcha a duas abnegadas professoras, que tiveram a iniciativa de enfrentar, no Sul, o trabalho de prevenção do suicídio. Aliás, uma das finalidades do CVV é a de instalar postos de atendimento nas principais capitais do país e nas grandes cidades do Estado de S. Paulo à medida em que forem surgindo, nessas cidades, elementos de boa-vontade, o CVV irá orientando e fornecendo todo o programa de preparação de plantonistas.

0 problema do suicídio em nossa sociedade, ainda é cercado de uma série de tabus e frases feitas. Por exemplo: : "Quem quer se matar não avisa". È uma frase-feita, repetida indefinidamente, sem qualquer fundamento em fatos. A experiência do CVV e dos demais centros de socorro telefônico instalado em outros países demonstra que o suicida em potencial dá muitos avisos. Na maioria das vezes, entretanto, tais aviso,- não são compreendidos por amigos e familiares; e a pessoa acaba se matando. Quando o indivíduo dispõe de um telefone, como o do CVV, ele se agarra realmente a esse telefone, que lhe representa a tábua lançada no oceano revolto, onde ele, náufrago da vida, poderá se agarrar. 0 plantonista do CVV oferece amizade ao suicida em potencial ; a amizade tão difícil de ser encontrada hoje em dia. Não proporciona auxílio financeiro nem o ajuda diretamente a solucionar seus problemas; proporciona-lhe o desabafo e o apoio moral, encorajando-o a enfrentar os problemas com renovada disposição. É a própria valorização da vida; superada a, crise suicida, o indivíduo não se sentirá dependente de ninguém e terá condições de enfrentar seus problemas.

"Suicídio se resolve com aumento de salário", é outra frase-feita absurda. 0 problema financeiro é o que menos pesa na decisão de suicídio de uma pessoa. Os motivos que levam realmente as pessoas a pensar em auto-destruição estão ligados, em sua esmagadora maioria, ao campo afetivo. É a chamada deterioração afetiva, que leva a pessoa, fatalmente, a sentir-se só. Um solitário no meio da multidão. Um indivíduo carente de amizade, de alguém que o considere digno de ser ouvido. E o CVV considera dignes de atenção todos que lhe batem às portas ou discam o número de seu telefone. Mesmo que o indivíduo faça a ligação telefônica para aplicar um "trote" no plantonista. Todos recebem amizade.

Atualmente o CVV conta com a colaboração de 45 plantonistas voluntários, entre homens e mulheres, atendendo a uma média de 15 casos de suicidas em potencial por mês. Seus plantonistas são indivíduos de boa-vontade que antes de ingressarem no trabalho, são obrigados a freqüentar um curso especializado. 0 atendimento é feito seguindo as normas da chamada "psicoterapia de apoio", e, quando necessário, a entidade se vale da colaboração de médicos psiquiatras, que também voluntariamente atendem às pessoas que lhes são encaminhadas. Não há doutrinação religiosa em nenhum atendimento; o CVV mantém contate com todas as religiões, e, desde que o indivíduo se mostre interessado, é encaminhado para a religião desejada.

A norma básica do atendimento, que é seguida por todo plantonista, resume-se numa frase: "Saber ouvir os problemas da pessoa". Conhecidos os problemas, usar as armas disponíveis pelo próprio indivíduo para que tais problemas sejam superados. É evidente que em tal atendimento entra a Religião como impulsionador maior: a Religião Cristã, que manda servir desinteressante.

COMO IDENTIFICAR UM SUICIDA EM POTENCIAL:

Rubens Santini de Oliveira





É preciso evitar novos suicídios!



“A Psicologia Clínica está preocupada em lidar com a tentativa de suicídio ocorrida e entendê-la para uma atuação pós-crise, desenvolvendo um acompanhamento terapêutico neste período difícil.

Alguns hospitais, como o Hospital São Paulo, já possuem um setor de atendimento psicológico para indivíduos que dão entrada no hospital por tentativa de suicídio mal-sucedido. Esta equipe especializada, objetiva prevenir novas tentativas de suicídios por parte destas pessoas e reintegrá-las ao convívio social, em vez de se preocupar apenas com a alta médica (recuperação física do interno), como ocorria até pouco tempo.

É possível tentar desenvolver um trabalho junto à família do suicida, uma vez que o suicídio se relaciona diretamente com a unidade familiar e o meio próximo ao individuo. Além disso, a família com um membro suicida encontra-se freqüentemente desamparada e impotente diante de tal situação”. “Minha querida filha, há seis meses que você dilapida seus recursos e compromete silenciosamente seus benefícios; dentro em breve seremos presas dos horrores da fome. É preferível que aquele que não serve para nada se vá; você acaba de sair para se submeter a mais algum sacrifício; quando voltar não me terá mais a sua custa”.



CVV dá ajuda por telefone



O CVV (Centro de Valorização da Vida) é um serviço telefônico grátis que atende 24 horas do dia. Recebem 4000 ligações por mês só na cidade de São Paulo.

O CVV possui alguns lemas como “somente aquele que sabe ouvir poderá ajudar” ou, o mais conhecido, “é mais fácil viver quando se tem um amigo”.

Todo o corpo de plantonistas é composto por pessoas voluntárias.

Um dos métodos de atuação do CVV é tentar entender a pessoa, sem minimizar o seu problema.

Por exemplo: a dor sentida por uma adolescente que briga com o namorado, pode ser muito grande para ela. A postura do CVV, neste caso, seria de compreensão. Jamais seria dito à jovem que procurasse um outro namorado, pois isso deve ser o que ela está ouvindo de todos.

O CVV aconselha que a atitude adotada por amigos de suicidas em potencial seja a mesma: “jamais diga para essa pessoa que seu sofrimento é uma bobagem”.

Um outro conselho do CVV é que seja permitido o desabafo, deixar a pessoa chorar, se extravasar. Quando a idéia de suicídio é exposto claramente, ou seja, quando é discutida, é mais dificil que ela se concretize. Qualquer coisa que passa pela linguagem é atenuada. Se alguém diz que tem medo de um vir a se matar, provavelmente não irá fazer isso”.



Como identificar um suicida em potencial:



Observar se a pessoa tem sintoma de :



- Depressão: Tristeza constante, ansiedade, insônia, perda de apetite, pessimismo, dificuldade de se concentrar.

- Falta de perspectiva: O que é diferente de uma tristeza temporária.

- Ficar atento a fatos importantes da vida da pessoa. Grandes perdas ou mudanças podem precipitar uma tentativa ao suicídio.

- Verificar se a pessoa já tentou se matar antes. Estas pessoas têm maior tendência a repetir a tentativa.

- Ficar atento para anúncios espontâneos de suicídio.

- Falar claramente sobre o tema. Pergunte diretamente se a pessoa pensa em se matar.



O que fazer se parente ou amigo quiser se matar:



- Ofereça ajuda médica ou psiquiátrica. Se necessário, leve-a mesmo a contragosto.

- Mantenha-a longe de armas de fogo, objetos cortantes, remédios como calmantes e de lugares altos.

- Converse sobre a situação que ela vive. Lembre-se de que a depressão tem cura e é passageira, com tratamento adequado ela acaba em duas ou três semanas. Para a pessoa deprimida, entretanto, a sensação é de que jamais haverá solução.

- Nem a deixe sozinha, nem durante a noite. Além de ter seus atos vigiados, ela se sentirá querida e estimulada.

- Trate o tema com clareza e sem preconceitos.las sombrias: - era meia dúzia de réprobos que passava enlouquecida, deixando à mostra cenas de afogamento, por arrastarem na mente conflagrada a trágica lembrança de quando se atiraram às suas águas!... Homens e mulheres transitavam desesperados: uns ensangüentados, outros estorcendo-se no suplício das dores pelo envenenamento, e, o que era pior, deixando à mostra o reflexo das entranhas carnais corroídas pelo tóxico ingerido, enquanto outros mais, incendiados, a gritarem por socorro em correrias insensatas, traziam pânico ainda maior entre os companheiros de desgraça, os quais receavam queimar-se ao seu contacto, todos possuídos de loucura coletiva! E coroando a profundeza e intensidade desses inimagináveis martírios — as penas morais: os remorsos, as saudades dos seres amados, dos quais não tinham mais notícias, os mesmos dissabores que haviam dado causa ao desespero e que persistiam em afligir!... E as penas físico-materiais: a fome, o frio, a sede, exigências fisiológicas em geral, torturantes, irritantes, desesperadoras! a fadiga, a insônia depressora, a fraqueza, o delírio!”

ALGUNS ARGUMENTOS CONTRA O SUICÍDIO

Rubens Santini de Oliveira





“O telefone toca... O plantonista atende...



Uma pessoa deseja morrer. Ingeriu comprimidos, deseja morrer conversando com alguém e espera que o plantonista possa ser esta pessoa, possa representar este outro para que não esteja só nesta passagem.

O plantonista arrisca perguntar se está certo de que‚ isto que realmente quer, se não gostaria que lhe fosse enviado socorro. A pessoa recusa, não quer voltar atrás e pede ao plantonista que fale com ela. A voz atenua-se... o telefone cai”.(*)



PARTE I



“Tentar compreender por que uma pessoa, de maneira impulsiva ou cuidadosamente planejada, escreve dizeres amorosos na sola do sapato para um namorado e se atira do viaduto do Chá; ou acomoda seu revólver numa morsa de oficina, na garagem de sua residência, coloca a cabeça diante da arma e dispara; ou amarra um cordel de náilon no teto do banheiro e se enforca; ou ingere dezenas de comprimidos de uma só vez; ou por que uma criança se joga da janela do décimo andar; ou, ainda, por que um padre acende as seis bocas do fogão na cozinha de um colégio, deitando-se sobre elas carbonizando-se, não é, absolutamente, tarefa fácil.

Foi numa tentativa de elucidar alguns fatores que possam estar em jogo na vivência destas pessoas, no momento em que decidem se matar, que este trabalho nasceu”.(**)



Por que as pessoas se matam?

O que poderá levar o homem a recorrer a esse ato tão irracional?



(1) Falta de Fé? - é a total descrença de uma outra vida após a morte. Tem a ilusão de que, provocando a própria morte, será o fim de todo o sofrimento e o início de um eterno sono profundo. É a falta de Espiritualidade e da crença nas obras do Criador.

(2) Orgulho ferido? - Pode ser considerado, também, como falta de fé, porque a fé‚ conduz à humildade, e esta é inimiga do orgulho.

(3) Tédio da vida? Muitas vezes, as pessoas não conseguem definir um objetivo em sua vida. No fundo, é ausência da fé para suportar as provas que a vida lhe impõe. As dificuldades são tantas, e não encontrando forças para sair do marasmo, a pessoa acaba se entediando. Quem tem fé não deserta da vida, pois sabe que os recursos Divinos são inesgotáveis. E a oração é o maior dos instrumentos para se conseguir que essa ajuda venha dos Planos mais Altos.

(4) Medo do fracasso? - Medo de ser humilhado, ironizado por não ter sido um vencedor. No fundo, todos os problemas que levam as pessoas ao suicídio é a falta de fé, é a fragilidade espiritual.

O nosso propósito, através desse trabalho, é fazer uma abordagem psicológica e espiritual do suicida, e quais são os motivos que o levam para tal ato.



PARTE II



“Há alguns anos, conheci Aparecida. Havia ingerido um poderoso agrotóxico e estava viva apenas graças à rapidez do socorro, uma diálise renal.

Sorria-me, sem graça, na expectativa do que ia fazer.

- O que houve Aparecida?

- Eu só ia dar um susto no meu marido. Tínhamos brigado.

- Você não sabia que poderia morrer?

- Pensei que aquilo só matava bicho sem osso...

Na sua simplicidade, Aparecida me dizia que não queria morrer. Ela tinha “ossos”, um esqueleto interno, mental, que a prendeu à vida.

Já outros suicidas têm um “esqueleto” mais frágil. E não suportam as vicissitudes da vida, mais ainda quando ela os frustra e lhes causa sofrimentos.

Existem sofrimentos que fazem parte da vida e há aqueles desnecessários. Muitos de nós não nos satisfazemos com os que já existem (e, muitas vezes, são tantos!). E procuramos outros. Como complicamos nossas vidas, como que atraídos pelo sofrer!

Não seria isto uma espécie de suicídio?”



“Nesta vida, morrer não é difícil. O difícil, é a vida e o seu oficio.”(Maiakvóski)



PARTE III



O suicídio através do tempo



“O suicidio, desde a Antiguidade, sempre foi punido severamente. Plutarco, um antigo historiador, nos conta o seguinte:



Moças passam a enforcar-se e logo apresenta uma “epidemia” de suicídio de jovens. Nenhuma medida fez com que ela cesse, até que alguém propõe que as jovens sejam condenados a terem seu cadáver levado nu, em passeata, até o cemitério. Com essa medida, a “epidemia” se extingue.”

“Em Tebas e Chipre, o morto era privado de honras fúnebres. Em Atenas, no século IV, cortava-se a mão direita daquele que cometera o suicídio. Esta era enterrada distante do resto do corpo do individuo de forma a evitar uma posterior vingança do morto. O objetivo era desmanchar seu estratagema, destituí-lo de poder, da capacidade de assassinar os vivos. Ainda no século IV, Santo Agostinho assinala que o suicídio era uma “pervesão detestável” e “demoníaca”, e que o “não matarás” estendia-se também a “não matarás a si próprio”. A Igreja utilizava todos os recursos disponíveis para a repressão ao suicídio. Outras religiões também condenavam o suicídio, como é o caso da judaica, com a prática de enterrar o corpo do suicida em sepultura à parte.”

“O suicídio do presidente Getúlio Vargas implica, não só um ato de vingança contra seus inimigos, que se sentiram culpados e responsáveis, mas principalmente, o objetivo do suicido foi a permanência de Vargas influenciando os sobreviventes, como numa vida pós-morte: “saio da vida para entrar na História”, escreve em sua carta-testamento.”

“Em novembro de l978, houve um suicídio coletivo de 913 pessoas na Guiana, seguidoras da seita Templo do Povo, do pastor americano Jim Jones. Eles se envenenaram com cianureto, enquanto seu líder deu um tiro na própria cabeça.”

“No primeiro semestre de 1986, o número de adolescentes suicidas cresceu no Japão. A policia atribuiu o fato à morte da cantora pop Yokiko Okada, então com 18 anos, que se jogou de uma altura de 7 andares. Foram registrados 30 suicídios entre adolescentes no país, após o acontecimento.”

“Personagens fictícios da literatura também inspira este tipo de gesto. Em 1774, o lançamento do livro “Werther” do poeta alemão Goethe, provocou uma onda de suicídio na Europa. Motivo: a identificação com o destino do personagem-título do livro, que se mata com um tiro por amor. A “epidemia” de suicídio foi tão longe que várias pessoas, na maioria jovens se matavam envergando casacos azuis e colete amarelo, as roupas que o personagem usava no final do livro.”

“Romeu e Julieta, da obra de Shakekspeare, assim como tantos Romeus e Julietas da vida real, se matam para vingar-se de seu ambiente e das pessoas que estão ao seu redor”

(Publicado no Boletim GEAE Número 332 de 16 de fevereiro de 1999)

O SUÍCIDIO (1ª Parte)

Rogério Coelho





"A Ciência Espírita ensina que, pelo suicídio sempre se perde o que se queria ganhar. O suicídio é o corolário da covardia moral, que por sua vez é o resultado a que leva a incredulidade, a simples dúvida sobre o futuro e as idéias materialistas." Allan Kardec (1)



Afirma ainda o Mestre Lionês:



"(...) Quando homens de ciência, apoiados na autoridade do seu saber, se esforçam por provar aos que os ouvem ou lê em que estes nada têm a esperar depois da morte, não estão de fato levando-as a deduzir que, se são desgraçados, coisa melhor não lhes resta senão se matarem? Que lhes poderiam dizer para desviá-los dessa conseqüência? Que compensação lhes podem oferecer? Que esperança lhes podem dar? Nenhuma, a não ser o nada...

Daí se deve concluir que, se o nada é o único remédio heróico, a única perspectiva, mais vale buscá-lo imediatamente e não mais tarde, para sofrer por menos tempo. A propagação das doutrinas materialistas é, pois, o veneno que inocula a idéia do suicídio na maioria dos que se suicidam, e os que se constituem apóstolos de semelhantes doutrinas assumem tremenda responsabilidade. Com o Espiritismo, tornada impossível a dúvida, muda o aspecto da Vida. O crente sabe que a existência se prolonga indefinidamente para lá do túmulo, mas em condições muito diversas; donde a paciência e a resignação que o afastam muito naturalmente de pensar no suicídio; donde, em suma, a coragem moral.

O Espiritismo ainda produz, sob esse aspecto, outro resultado igualmente positivo e talvez mais decisivo: apresenta-nos os próprios suicidas a informar-nos da situação desgraçada em que se encontram e a provar que ninguém viola impunemente a Lei de Deus, que proíbe ao homem encurtar a sua Vida. Entre os suicidas, alguns há cujos sofrimentos, nem por serem temporários e não eternos, não são menos terríveis e de natureza a fazerem refletir os que porventura pensam em daqui sair, antes que Deus o haja ordenado

O suicídio tem sempre por causa um descontentamento, quaisquer que sejam os motivos particulares que se lhes apontem. Ora, aquele que está certo de que só é desventurado por um dia e que melhores serão os dias que hão de vir, enche-se facilmente de paciência. Só se desespera quando nenhum termo divisa para os seus sofrimentos. E que é a Vida humana, com relação à Eternidade, senão bem menos que um dia? Mas, para o que não crê na Eternidade, e julga que com a Vida tudo se acaba, se os infortúnios e as aflições o acabrunham, unicamente na morte vê uma solução para as suas amarguras. Nada esperando, acha muito natural, muito lógico mesmo, abreviar pelo suicídio as suas misérias.(2)

O Espírita tem vários motivos para contrapor à idéia do suicídio: a certeza de uma Vida Futura, em que, sabe-o ele, será tanto mais ditoso, quanto mais inditoso e resignado haja sido na Terra: a certeza de que, abreviando seus dias, chega, precisamente, a resultado oposto ao que esperava; que se liberta de um mal, para incorrer num mal pior, mais longo e terrível; que se engana, imaginando que, com o matar-se, vai mais depressa para o céu; que o suicídio é um obstáculo a que no outro mundo ele se reúna aos que foram objeto de suas afeições e aos quais esperava encontrar; donde a conseqüência de que o suicídio, só lhe trazendo decepções, é contrário aos seus próprios interesses. Por isso mesmo, considerável já é o número dos que têm sido, pelo Espiritismo, obstados de suicidar-se, podendo daí concluir-se que, quando os homens forem Espíritas, deixará de haver suicidas conscientes. Comparando-se, então, os resultados que as doutrinas materialistas produzem com os que decorrem da Doutrina Espírita, somente do ponto de vista do suicídio, forçoso será reconhecer que, enquanto a lógica das primeiras a ele conduz, a da outra o evita, fato que a experiência confirma."



Atentemos para a exortação de Santo Agostinho:



"(...) Até quando os vossos olhares se deterão nos horizontes que a morte limita? Quando, afinal, vossa alma se decidirá a lançar-se para além dos limites de um túmulo? Houvésseis de chorar a Vida inteira, que seria isso, a par da eterna glória e resignação? Buscai consolações para os vossos males no porvir que Deus vos prepara e procurai-lhes a causa no passado. E vós, que mais sofreis, considerai-vos os afortunados da Terra.

(...) Se na maior acerbidade dos vossos sofrimentos, entoardes hinos ao Senhor, o anjo, à vossa cabeceira, com a mão vos apontará o sinal da salvação e o lugar que um dia ocupareis. A fé é o remédio seguro do sofrimento; mostra sempre os Horizontes do Infinito diante dos quais se esvaem os poucos dias brumosos do presente. Não nos pergunteis, portanto, qual o remédio para curar tal úlcera ou tal chaga, para tal tentação ou tal prova. Lembrai-vos de que aquele que crê é forte pelo remédio da fé; e aquele que duvida um instante da sua eficácia é imediatamente punido, porque logo sente as pungitivas angústias da aflição.

O Senhor apôs o Seu selo em todos os que n`Ele crêem. O Cristo vos disse que com a fé se transportam montanhas e eu vos digo que aquele que sofre e tem a fé por amparo, ficará sob a sua égide e não mais sofrerá. Os momentos das mais fortes dores que lhe serão as primeiras notas alegres da Eternidade. Sua Alma se desprenderá de tal maneira do corpo, que, enquanto se estorcer em convulsões, ela planará nas regiões celestes, entoando, com os anjos, hinos de reconhecimento e de glória ao Senhor.

Ditosos os que sofrem e choram! Alegres estejam suas almas, porque Deus as cumulará de bem-aventuranças." (3)



1 - Kardec, A. in "O Livro dos Espíritos" - conclusão VII

2 - Kardec, A. in "O Evangelho Segundo o Espiritismo" - Capítulo V, item 16

3 - Kardec, A. in "O Evangelho Seg. o Espiritismo" - Capítulo V, item 16

O SUICÍDIO (2ª Parte)

Antônio Fernandes Rodrigues





"Todo aquele suicida presume que a morte é o fim do amargor, sem saber que o desespero é a porta para outra dor." - Casimiro Cunha

Um dos atos mais nefastos que o homem pratica é sem dúvida o suicídio, esse execrável assassinato de si mesmo. Aliás, somente quem não é religioso comete crime dessa natureza. Muitos suicidas dizem-se religiosos, mas na verdade não são, porque todas as religiões condenam essa loucura abominável.

Os livros espíritas relatam casos horrorosos de suicídios. São inenarráveis os padecimentos daqueles que julgavam livrarem-se dos sofrimentos que viviam e centuplicaram os mesmos com o suicídio.

Alertam que os dos encarnados são sofrimentos passageiros e os dos suicidas prolongam-se por tempo indeterminado e quando reencarnam tais criaturas têm que recapitular as expiações programadas e não cumpridas na existência anterior, com os acréscimos que a Lei Divina determina, segundo as atenuantes ou agravantes.

Os livros de Allan Kardec, André Luiz, Yvonne A. Pereira, Zilda Gama e tantos outros, somando uns trinta títulos, descrevem casos que realmente causam piedade, cujos sofrimentos ultrapassam tudo que possamos imaginar.

Quem ler, por exemplo os relatos constantes do livro "O Céu e o Inferno", de Allan Kardec, nos quais os suicidas mencionam os seus pungentes sofrimentos, eliminará de sua mente a idéia de suicídio, mesma que esteja passando por situação dolorosa, pois esta passa, enquanto que as dos suicidas ultrapassam tudo o que possamos imaginar.

Vejamos um deles:

Faz quase seis anos que esse homem morreu, e sempre se vê caindo da torre e indo despedaçar-se nas pedras. Apavora-o vazio que tem diante de si, sente as apreensões da queda...E isto, há seis anos! Quanto tempo durará? Não o sabe, e esta incerteza aumenta a sua agonia." François-Simon Louvet suicidou-se em 03/07/1857, em Havre na França. (Cap. V - Segunda Parte - Suicidas).

Vejamos outro caso:

Leviana que fui, quando me vi só, e aparentemente desamparada, entreguei meus pobres filhos a parentes caridosos e sorvi, louca, o veneno que me desintegraria o corpo menosprezado. Supunha reencontrar o esposo querido ou chafurdar-me no abismo da inexistência; todavia, nem uma realização nem outra me surpreenderam o coração. Despertei sob denso nevoeiro de lama e cinza e debalde clamei socorro, à face dos padecimentos que me asfixiavam. Coberta de chagas, qual se tóxico letal me atingisse os mais finos tecidos da alma, gritei sem destino certo!"

Libertação - André Luiz - Edição FEB - Págs. 218 e 219.

Ninguém burla a Lei. O que plantarmos, colheremos; portanto, não adianta queremos fugir dos compromissos assumidos.

Quem não se esforça por vencer as dificuldades, não suporta as agressões do companheiro(a), nem supera os desgostos das deficiências de seu corpo, abandonando a vestimenta carnal pelo suicídio, arrepender-se-á amargamente, porque os padecimentos que advirão serão muitíssimos mais dolorosos e difíceis de vencer.

O SUICÍDIO (3ª Parte)

Sérgio Biagi Gregório





1. INTRODUÇÃO



Quais são as causas que nos levam a tentar o suicídio? Por que um indivíduo apodera-se da direção de um avião e se transforma num homem-bomba? Tem o homem o direito de tirar a sua própria vida? Por que? Quais as conseqüências deste ato fatal na vida humana? Estas são, entre muitas outras, questões vitais para o entendimento do problema do suicídio. O nosso objetivo é analisar o tema segundo os pressupostos espíritas.



2. CONCEITO



Dado que o suicídio afeta todos os aspectos da vida humana, ele deve ser estudado levando-se em conta os componentes físicos, sociais, mentais etc. e que, em conseqüência, obedece a uma causação múltipla. A cada um desses componentes corresponde um ângulo de análise, e a cada ângulo, uma definição patológica, sociológica, moral, filosófica etc. Estas não devem ser necessariamente contraditórias, mas complementares.

De um modo geral, define-se suicídio como a ação pela qual alguém põe intencionalmente termo à própria vida. É um ato exclusivamente humano e está presente em todas as culturas.

Do ponto de vista da Doutrina Espírita, o suicídio é considerado um crime, e pode ser entendido não somente no ato voluntário que produz a morte instantânea, mas em tudo quanto se faça conscientemente para apressar a extinção das forças vitais. Importa numa transgressão da Lei Divina. É sempre uma falta de resignação e de submissão à vontade do Criador.

(Equipe da FEB, 1997)



3. HISTÓRICO



Percorrendo a história da humanidade, notamos que na Antigüidade os hebreus foram os que menos cometeram o suicídio. As Escrituras registram apenas o suicídio de Abimileque, de Saúl, de Aquitofel, de Zambri e pouco mais.

Nos povos orientais, o suicídio é um fato vulgar e normal. Os japoneses adotam o haraquiri, ritual de suicídio usando a espada. São famosos os camicases, pilotos japoneses, membros de um corpo de voluntários que no fim da 2.ª Guerra Mundial, treinados para desfecharem um ataque suicida contra objetivos inimigos, especialmente navios. Na Índia não se contam os suicídios senão aos milhares

Na história do Egito, tornou-se célebre o suicídio de Cleóprata.

Em Cartago eram também freqüentes os suicídios. Amílcar matou-se humilhado por uma derrota e Aníbal suicidou-se para não cair nas mãos dos seus inimigos. Códio, rei de Atenas, matou-se para livrar o seu país dos horrores da guerra.

Na Idade Média, período caracterizado por uma maciça dominação religiosa, o suicídio diminuiu, pois quem o cometesse não recebia as bênçãos da Igreja. Na renascença, período de maior liberdade religiosa, o suicídio recrudesceu e continua até nos dias atuais, principalmente explicados pelos problemas causados pela Revolução Industrial e pelo Capitalismo nascente, os quais diminuíram os apelos à Religião. (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira)



4. CAUSAS DO SUICÍDIO



As causas do suicídio são numerosas e complexas. Elas são geralmente analisadas sob três aspectos:



PERSPECTIVA BIOLÓGICA



Pesquisas indicam que o comportamento suicida acontece em famílias, sugerindo que fatores biológicos e genéticos desempenham papel de risco. Algumas pessoas nascem com certas desordens psiquiátricas tal como a esquizofrenia e o alcoolismo, o que aumenta o risco de suicídio.



TEORIAS PSICOLÓGICAS



Em princípio o suicídio é comparado por muitos psicológicos com os casos de neurose.

Os determinantes do suicídio patológico estão nas perturbações mentais, depressões graves, melancolias, desequilíbrios emocionais, obsessões, delírios crônicos.

O psiquiatra americano Karl Menninger elaborou sua teoria baseando-se nas idéias de Freud. Ele sugeriu que todos os suicidas tem três dimensões inconscientes e interrelacionadas: vingança/ódio (desejo de matar); depressão/desespero (desejo de morrer); culpa/pecado (desejo de ser morto).



SENTIDO SOCIOLÓGICO



Socialmente o suicídio é um ato que se produz no marco de situações anômicas (desorganizadas) em que os indivíduos se vêem forçados a tirar a própria vida para evitar conflitos ou tensões inter-humanas, para eles insuportáveis. Para Émile Durkheim, a causa do suicídio só pode ser sociológica. Em seu estudo caracterizou três tipos de suicidas:

a) suicida egoísta. A pessoa se mata para não sofrer mais;

b) suicida altruísta. A pessoa se mata para não dar trabalho aos outros (geralmente pessoas de idade);

c) suicida anômico. A pessoa se mata por causa dos desequilíbrios de ordem econômica e social. Exemplo: a Revolução Industrial, tirando empregos de algumas pessoas, estimulou-lhes o suicídio. (Enciclopédia Encarta)



5. ESTATÍSTICA



A Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou em 1 milhão o número de suicídios em 2000. De acordo com a organização, a média anual de suicídios no mundo passou de 10,1 a cada 100.000 habitantes, em 1950, para 16 casos no mesmo universo de pessoas em 1995, o que corresponde a um aumento de 60%.

Países do Leste Europeu são os recordistas em média de suicídio por 100.000 habitantes. A Lituânia (41,9), Estônia (40,1), Rússia (37,6), Letônia (33,9) e Hungria (32,9). Guatemala, Filipinas e Albânia estão no lado oposto, com a menor taxa, variando entre 0,5 e 2. Os demais estão na faixa de 10 a 16.

Em números absolutos, porém, a China lidera as estatísticas. Foram 195 mil suicídios no ano de 2000, seguido pela Índia com 87 mil, a Rússia com 52,5 mil, os Estados Unidos com 31 mil, o Japão com 20 mil e a Alemanha com 12,5 mil. (Folha de São Paulo, 05/07/2000, p. a11).

Resumindo: na Ásia e Oriente a taxa de suicídio por 100.000 habitantes é mais do que 16, na América do Norte situa-se entre 8 e 16, na América do Sul apresenta-se com menos de 8 e na África não há dados disponíveis.

Gertner calcula que por cada suicídio completado há 10 tentativas. Os homens tendem a se suicidar de modo violento; as mulheres de modo suave e em menor proporção.

Observação: há que se tomar cuidado na comparação estatística entre nações, porque nem todos têm o mesmo conceito do que seja morrer por suicídio.



6. CENTROS DE PREVENÇÃO



O Reverendo Chad Varah, de 89 anos, é o criador do serviço de prevenção ao suicídio. Samaritanos é o nome britânico da ONG cuja similar brasileira funciona desde o início dos anos 60 como CVV, Centro de Valorização da Vida.

Pastor anglicano, Chad Varah começou seu trabalho em 1936, quando foi chamado para oficiar o funeral de uma menina de 14 anos. A garota havia se suicidado ao ficar menstruada pela primeira vez. Desesperada, pensou que havia contraído uma doença. Esse episódio chocou de tal maneira o jovem reverendo que ele resolveu dar aulas de educação sexual para jovens. Descobriu depois, numa notícia de jornal, que três pessoas se suicidavam a cada dia em Londres. Foi assim que, em 1953, numa pequena sala munida de telefone na Igreja de St. Stephen, no centro londrino, ele fundou os Samaritanos. (Folha de São Paulo, 24/06/2001, p. A 19)

Atualmente há muitos Centros como esses, inclusive com endereço na Internet. No Brasil, além do CVV, há também o Socorro Emocional, que do mesmo modo que o CVV, segue os preceitos do psicólogo norte-americano Carl Rogers (1902-1987), cuja tese é a de que todo o ser humano tem potencial suficiente para encontrar saídas para o seu próprio problema.



7. DOUTRINA ESPÍRITA



ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DAS OBRAS BÁSICAS DE ALLAN KARDEC

Em O Livro dos Espíritos, nas perguntas 943 a 957, Allan Kardec discute o tema apontando as causas e as conseqüências deste ato sinistro. Diz-nos que o desgosto pela vida é efeito da ociosidade, da falta de fé e geralmente da sociedade. Para aqueles que exercem as suas faculdades com um fim útil e segundo as suas aptidões naturais, o trabalho nada tem de árido a vida se escoa mais rapidamente. Os Espíritos nos advertem que quando cometemos o suicídio responderemos como por um criminoso. Acrescenta ainda que "aquele que tira a própria vida para fugir à vergonha de uma ação má, prova que tem mais em conta a estima dos homens que a de Deus, porque vai entrar na vida espiritual carregado de suas iniquidades, tendo-se privado dos meios de repará-las durante a vida. Deus é muitas vezes menos inexorável que os homens: perdoa o arrependimento sincero e leva me conta o nosso esforço de reparação; mas o suicídio nada repara".

Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, no capítulo V - Bem-Aventurados os Aflitos, analisa o suicídio juntamente com a loucura, e nos diz que "a calma e a resignação, hauridas na maneira de encarar a vida terrestre, e na fé no futuro, dão ao Espírito uma serenidade que é o melhor preservativo contra a loucura e o suicídio". A leitura atenta deste capítulo do Evangelho seria um preservativo para todos os males da humanidade, pois não só nos explica os meios de nos livrarmos da pena como também nos alerta para o bem e o mal sofrer, sobre a melancolia etc.

Em O Céu e o Inferno, no capítulo V, há relatos dos próprios suicidas sobre o seu estado infeliz na erraticidade. Verificando cada um deles, vamos observar que, embora o sofrimento seja temporário, nem por isso deixa de ser difícil, pois o remorso parece não ter fim.



ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DAS OBRAS COMPLEMENTARES



No livro Memórias de um Suicida, fala-se do vale dos suicidas, ou seja, o lugar para onde vão as almas daqueles que cometeram o suicídio. Por que vale? É um lugar que tem um desnível com relação ao plano? Dá-se a impressão que todos os que cometem o suicídio vão para esse lugar de sofrimento atroz, em que figuras dantescas aparecem a todo o momento, e o indivíduo que cometeu o suicídio fica sentindo os germes comerem o seus restos mortais.

Em Mecanismos da Mediunidade, o Espírito André Luiz, ao discutir sobre a ideoplastia do pensamento, fornece-nos elementos para a nossa reflexão sobre este tema. Se muitos ficam pensando no suicídio, eles criam um campo mental, uma espécie de aura de formas- pensamentos, e se um Espírito menos avisado entrar nessa faixa vibratória, ele poderá ser induzida ao cometer este ato. Por isso, precisamos tomar cuidado com o teor energético do nosso pensamento, pois uma vez emitido ele criará as forças desencadeantes para a ação



REFLEXÕES BASEADAS NOS PRESSUPOSTOS ESPÍRITAS



1. Continuar Vivo. Um dos grandes embaraços de quem comete o suicídio, pensando que teria dado cabo da vida, é a surpresa de que continua vivo. Nesse sentido, de que vale tirar-nos a vida, se continuamos a existir?

2. Atenuantes e Agravantes. Não temos o hábito de relacionar a parte e o todo e podemos cair no erro da absolutização do relativo. É o caso de estigmatizar todos os Espíritos que cometeram suicídio, colocando-os num mesmo grau de sofrimento e punição. Há que se considerar a influência que receberam dos outros, os seus estados mentais etc. Será que nós, com o nosso modo impensado de agir, não os induzimos involuntariamente? Será que a sociedade, pelo seu descaso, não deixou de auxiliá-los, quando podia fazê-lo?

3. O Espírita tem de opor-se à idéia do suicídio. A certeza da vida futura lhe dá condições de saber que será menos ou mais feliz de acordo com a resignação com que tiver suportado os sofrimentos aqui na Terra.

4. Suicídio inconsciente. O relato do Espírito André Luiz, quando estava no umbral - e ouvia chamá-lo de suicida -, é marcante, pois mesmo não o tendo cometido voluntariamente, dissipou desordenadamente as suas energias físicas e mentais. No campo mental, a cólera, a falta de autodomínio e inadvertência no trato com os semelhantes; no campo físico, o aparelho gástrico foi destruído à custa de excessos de alimentação e bebidas alcoólicas.

5. Orar e vigiar. Nunca se deve dar tanta atenção a este dispositivo da mente. Há muitos momentos de angústia, de solidão, mas temos que passar por cima como um trator que vai moendo tudo o que lhe vem de encontro. Utilizando-nos da prece e da vigilância, podemos aliviar muitos desses males do pensamento.



8. CONCLUSÕES



Enfrentemos a nossa vida, pois não podemos ter outra. Lembremo-nos de que o problema pode não ser tão grave quanto a nossa imaginação o pinta. Quem sabe se esperarmos um pouco mais, exercitando a paciência e a resignação, a dificuldade não toma outro rumo, a doença não recebe o remédio correto, o desgosto não tem o consolo necessário? Depositemos a nossa confiança inteiramente em Deus. Ele sabe o momento oportuno de nos tirar do embaraço.



9. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA



EQUIPE DA FEB.

O Espiritismo de A a Z. Rio de Janeiro, FEB, 1995.



KARDEC, A.

O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina Segundo o Espiritismo. 22 ed., Rio de Janeiro, FEB, 1975.

O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed., São Paulo, IDE, 1984.

O Livro dos Espíritos. 8. ed., São Paulo, FEESP, 1995.



XAVIER, F. C.

Mecanismos da Mediunidade, pelo Espírito André Luiz. 8. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1977.



Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira.

Lisboa/Rio de Janeiro, Editorial Enciclopédia, s.d. p.



Enciclopédia Encarta.

http://encarta.msn.com, SILVA, B. (coord.)



Dicionário de Ciências Sociais.

Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1986.

O SUICÍDIO (4ª Parte)

Richard Simonetti





1 – O suicida permanece muito tempo em regiões de sofrimento, no plano espiritual, ou logo reencarna?

- Depende de suas necessidades e de como reage à situação que criou. Há os que retornam de imediato à carne. Há os que fazem estágios em regiões de sofrimento. Depois são acolhidos em instituições hospitalares que funcionam nas proximidades dos chamados vales dos suicidas, como descreve Camilo Castelo Branco (1825-1890), no livro Memórias de um Suicida, psicografado por Yvonne Pereira.



2 – Considerando o estado de desequilíbrio de quem comete o gesto tresloucado, não será contra-producente reconduzi-lo à reencarnação?

- Em alguns casos é uma necessidade, oferecendo-lhe a bênção do esquecimento e ajudando-o a superar as fixações que precipitaram sua fuga no pretérito.



3 – Haverá alguma conseqüência no novo corpo?

- O corpo espiritual ou perispírito é um molde da forma física. Se tem desajustes, estes tenderão a refletir-se nela. Acontece freqüentemente com o suicida.



4 – Poderia dar alguns exemplos?

- Quem se mata por afogamento terá problemas respiratórios. Quem ingeriu um corrosivo terá desajustes no aparelho digestivo. Quem atirou na cabeça poderá reencarnar com retardo mental, paralisia cerebral e males semelhantes. Quem põe fogo no corpo terá graves problemas dermatológicos.



5 – Seria uma espécie de castigo?

- Mais exatamente uma conseqüência. Se uso uma faca imprudentemente, acabo me cortando. Deus não estará me castigando. Apenas estarei colhendo o resultado de minha imprudência.



6 – Uma encarnação é suficiente para o suicida livrar-se dos desajustes gerados por seu ato?

- Isso depende de vários fatores, envolvendo o grau de comprometimento com o gesto tresloucado. Como regra diríamos que, quanto mais esclarecido for, quanto mais ampla sua noção a respeito das responsabilidades da vida, maior o estrago perispiritual, mais demorada a recuperação.



7 – Pode prolongar-se por mais de uma existência?

- É possível, dependendo de como reage. Podem ocorrer complicações, envolvendo, sobretudo, a reincidência. Em existência futura o indivíduo sentir-se-á tentado a cometê-lo novamente, quando enfrentar situações que motivaram sua fuga no passado.



8 – Há um aumento preocupante de suicídios em todos os países. O que pode ser feito a respeito?

- A Doutrina Espírita é uma vacina contra o suicídio, mostrando-nos que se trata de uma porta falsa, que nos precipita em sofrimentos mil vezes acentuados. Por isso, um dos grandes recursos para combater o suicídio é a sua divulgação. Trata-se de um trabalho abençoado que todos podemos desenvolver, particularmente usando livros espíritas, distribuindo-os a mão cheia, como ensina Castro Alves (1847-1871).



Do livro: Reencarnação: Tudo o que você precisa Saber

SUÍCIDIO - UMA VISÃO ESPÍRITA

Francisco Aranda Gabilan





Dar fim à própria vida, abrir mão de todas as possibilidades, por uma possível paz, é o caminho que muitos seguem, de forma consciente ou não; mas, ao invés de se mostrar uma solução, transforma-se num longo caminho de dor, sofrimento e libertação.

É impressionante e, até mesmo, aterrador que tenhamos que chamar de “atual” o tema relativo ao suicídio, seja voluntário, seja indireto. Mas, lastimavelmente, é atual mesmo: é um mal crescente, atingindo toda humanidade.

Sua ocorrência sempre foi constante, desde o passado remoto e em todos os segmentos sociais e étnicos, até mesmo, crianças. Existem relatos de suicídios, tanto individuais, quanto coletivos, em várias culturas indígenas.

Daí a sua atualidade. Aliás, não é por outra razão que o assunto tem sido objeto de preocupação de antropólogos, sociólogos, médicos, psiquiatras, psicólogos, enfim de todos os ramos de ciência do Ser – e obviamente, dos Espíritas, sempre atentos às chagas da humanidade.

É exemplo disso o número de palestras, debates e artigos que solicitam aos espíritas sobre o assunto, incluindo o número de que sempre surgem sobre o mesmo tema. Vale dizer, numa palavra: se há perguntas, é porque o tema necessita de ampla abordagem.



1. Como os Espíritos e o Espiritismo consideram o suicídio?

R: Usando unicamente os ensinos dos Espíritos constantes da Codificação, o suicídio é tido como um crime aos olhos de Deus (Céu e Inferno, cap. 5), e que importa numa transgressão da Lei Divina (Livro dos Espíritos, pergunta 944) e constitui sempre uma falta de resignação e submissão à vontade do Criador (idem, perg. 953-a). Desse modo, “jamais o homem tem o direito de dispor da vida, porquanto só a Deus cabe retirá-lo do cativeiro da Terra, quando o julgue oportuno. O suicida é qual o prisioneiro que se evade da prisão, antes de cumprida a pena; quando preso de novo, é mais severamente tratado. O mesmo se dá com o suicida que julga escapar às misérias do presente e mergulha em desgraças maiores” (Evangelho Segundo o Espiritismo, cap XXVII, item 71)



2. Por que os Espíritos tratam desse assunto com certa constância?

R: Primeiramente, como já afirmamos, porque ele é tema sempre atual, pois que o suicídio tem sido marca constante de nossa civilização; segundo, que é o mais importante: a doutrina dos Espíritos, tem um caráter consolador absoluto: através do fato mediúnico (no dizer do cultíssimo Herculano Pires, o fato mediúnico é literalmente uma segunda ressurreição) o espírito volta à carne, não a que deixou no túmulo, mas a do médium que lhe oferece, num gesto de amor, a oportunidade de retorno aos corações que deixou no mundo (Mediunidade, cap 5), é permitido que os próprios suicidas venham dizer-nos que eles não morreram e afirmam que não só não solucionaram o problema que os levou ao ato extremo, como ainda estão “vivos” e, de quebra, com dois problemas: o antigo e o novo, gerado pela violação das leis da Vida. Assim, o Espiritismo trabalha preventivamente para que as pessoas saibam das responsabilidades em praticar atos que possam agravar sua situação futura e não para condená-las ao martírio eterno.



3. Quais as causas que levam o Ser ao suicídio?

R: A incredulidade, a falta de fé, a dúvida, as idéias materialistas. Em suma, crer que o Nada é o futuro, como se o Nada pudesse oferecer consolação, como se fosse remédio para supostamente abreviar o sofrimento, crença que, na verdade, se constitui em covardia moral.



4. Quais as conseqüências do suicídio para o Espírito?

R: Em primeiro lugar, é preciso aclarar-se que o suicídio não apaga a falta cometida, mas, ao contrário, em vez de uma haverá duas; em segundo, que o Espírito, quando se dá conta do ato cometido, constata que nada valeu, ficando literalmente desapontado com os efeitos obtidos e que não eram os buscados, pois se certifica que a vida não se extinguiu e que continua mais real que nunca. Terceiro, e que é bastante doloroso, o suicídio agrava todos os sofrimentos: “depois de prolongados suplícios, nas regiões purgatórias, freqüentemente, após diversas tentativas frustradas de renascimento, readquirem o corpo de carne, mas transportam neles deficiências do corpo espiritual, cuja harmonia desajustaram. Nessa fase, exibem cérebros retardados ou moléstias nervosas obscuras”, segundo Emmanuel em Leis de Amor, capitulo VI.



5. Então, não há esperança de recuperação para o suicida?

R: Claro que há – total! Deus é Amor e Ele outorga a todas as Criaturas a maior expressão da Sua Bondade Infinita: a possibilidade de os Seres evoluírem sempre, incessantemente; permite que as existências se sucedam ofertando as oportunidades infinitas de reajuste e reforma; e isso é possível através do mais efetivo veiculo da Lei de Evolução: a reencarnação.



Portanto, os familiares do suicida de ontem ou de hoje não se exasperem, ao contrário, mantenham viva a esperança de que é possível a remissão das faltas e que o Pai de Misericórdia propiciará os meios de fazer com que o próprio autor do ato extremo se reconheça Espírito Eterno e indestrutível, e que a calma, a resignação e a fé serão os mais seguros preservativos contra as idéias autodestrutivas. Não será demais que se lhes repita: Deus é Bondade Infinita e, portanto, não permite que Suas Criaturas sofram indefinidamente e que esse sofrimento poderá ser abreviado mais rapidamente mercê de orações sinceras e cheias de amor de todos quantos querem que se restabeleça o Bem.



Do livro: Entre o Pecado e a Evolução Notas: Revista Espiritismo e Ciência 11, páginas 06-08)

PROVAS E SUICÍDIO.

Centre Spirite Lyonnais Allan Kardec



Desde que se admita Deus, não podemos concebê-LO sem a infinidade das perfeições ; Ele deve ser todo poderoso, todo justiça, todo bondade, sem isso não seria Deus. Se Deus é soberanamente bom e justo, não pode agir por capricho nem com parcialidade. As vicissitudes da vida têm uma causa, e desde que Deus é justo, esta causa deve ser justa. Eis do que cada um deve bem se compenetrar. Deus colocou os homens sobre o caminho dessa causa pelos ensinamentos de Jesus, e hoje, julgando-os bastante maduros para a compreender, Ele lhes revelou tudo por inteiro pelo Espiritismo, isto é pela voz dos Espíritos.

O homem sobre a terra, e colocado sob a influência das idéias carnais, vê nessa provas apenas o lado penoso ; mas na vida espiritual, compara essas gozos fugidios e grosseiros com a felicidade inalterável que ele entrevê, e então vê que foram apenas sofrimentos passageiros. O Espírito pode então escolher a prova mais rude, e por conseqüência a existência mais penosa na esperança de chegar mais rápido a um estado melhor, como na doença escolheria freqüentemente o remédio mais desagradável para se curar mais cedo. Aquele que quer ligar seu nome à descoberta de um país desconhecido não escolhe uma rota florida ; sabe dos perigos que corre, mas sabe também a glória que o espera se for bem sucedido.

A doutrina da liberdade de escolha de nossas existências e das provas que devemos suportar cessa de parecer extraordinária se consideramos que os Espíritos, livres da matéria, apreciam as coisas de uma maneira diferente do que o fazemos nós mesmos. Eles se apercebem do objetivo, de maneira bem mais séria para eles do que dos gozos do mundo ; após cada existência, vêm o que fizeram no passado, e compreendem o que lhes falta ainda atingir em pureza : eis porque se submetem voluntariamente à todas as vicissitudes da vida corporal procurando, por eles mesmos, aquelas que podem fazê-los lá chegar mais prontamente. É por isso justamente que nos admiramos de não ver o Espírito dar preferência a uma existência mais doce. Ele não poderia gozar, em seu estado de imperfeição, uma vida isenta de amarguras ; mas a entrevê, e é para aí chegar que procura se melhorar.

Aqueles que nascem em semelhantes condições certamente não fizeram nada nesta vida para merecer tão triste sorte, sem compensação, sem que a pudessem evitar, impotentes de a mudar por eles mesmos, e que os coloca à mercê da comiseração pública. Por que então estes seres tão desgraçados, enquanto que a seu lado, sob o mesmo teto, na mesma família, outros são favorecidos sob todos os aspectos ?

Que dizer enfim das crianças que morrem em tenra idade e tendo conhecido da vida apenas os sofrimentos? Problemas que nenhum filósofo pode ainda resolver, anomalias que nenhuma religião pode justificar, e que seriam a negação da bondade, da justiça e da providência de Deus, na hipótese de que a alma fosse criada ao mesmo tempo que o corpo, e que sua sorte estivesse irrevogavelmente fixada após uma residência de alguns instantes sobre a terra. Que fizeram eles, essas almas que acabam de sair das mãos do Criador, para sofrer tanta miséria aqui em baixo, e merecer no porvir uma recompensa ou uma punição qualquer, enquanto ainda não puderam fazer nem bem nem mal?

Entretanto, não é necessário crer que todo sofrimento suportado aqui em baixo seja necessariamente indicação de uma falta determinada ; são, freqüentemente, simples provas escolhidas para acabar sua depuração e acelerar seu adiantamento. Assim a expiação serve sempre de prova, mas a prova não é sempre uma expiação ; mas, provas e expiações, são sempre sinais de uma inferioridade relativa, porque aquele que é perfeito não tem necessidade de ser provado. Um Espírito pode então ter adquirido um certo grau de elevação, mas, querendo avançar ainda, solicita uma missão, uma tarefa a cumprir, da qual, se sair vitorioso, será tanto mais recompensado quanto mais penosa a luta tenha sido. Tais são mais especialmente essas pessoas com instintos naturais bons, de alma elevada, de nobres sentimentos natos que parecem não ter trazido nada de mau de sua existência precedente, e que suportam com uma resignação toda cristã as maiores dores, pedindo a Deus que as suportem sem murmurar. Ao contrário, pode-se considerar como expiações as aflições que excitam murmurações e impelem o homem à revolta contra Deus.



Pode-se ler na questão 957 de O Livro dos Espíritos :



« Quais são, em geral, as conseqüências do suicídio para o estado do Espírito ? »

« As conseqüências do suicídio são muito diversas ; não há penas fixadas, e em todos os casos são sempre relativas às causas que a ele conduziram ; mas uma conseqüência à qual o suicida não pode escapar, é o desapontamento. De resto, a sorte não é a mesma para todos : depende das circunstâncias ; alguns expiam sua falta imediatamente, outros em uma nova existência que será pior que aquela da qual interromperam o curso. »

A observação mostra, com efeito, que a situação dos suicidas não é sempre a mesma ; mas há as que são comuns a todos os casos de morte violenta, e que são conseqüência da interrupção brusca da vida. Isso porque, antes de tudo, existe a persistência mais prolongada e mais tenaz do laço que une o Espírito ao corpo, laço esse que está quase sempre com toda sua força no momento em que foi quebrado, enquanto que na morte natural ele se enfraquece gradualmente, e freqüentemente é desatado antes que a vida seja completamente extinta. As conseqüências desse estado de coisas são o prolongamento da perturbação espiritual seguido depois da ilusão que, durante um tempo mais ou menos longo, faz crer ao Espírito que ele ainda está entre o número dos vivos.

A afinidade que persiste entre o Espírito e o corpo produz, em alguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo sobre o Espírito que assim se ressente, malgrado os efeitos da decomposição, e passa por uma plena sensação de angústia e de horror, estado esse que pode persistir por um longo tempo e ter a duração do restante da vida que eles acabaram de interromper. Esse efeito não é geral ; mas em alguns casos de suicídio o Espírito não é libertado das conseqüências de sua falta de coragem, e cedo ou tarde expia seu erro de uma maneira ou de outra. É assim que certos Espíritos, que tinham sido muito infelizes sobre a terra, disseram ter sido suicidas em sua existência precedente, e terem sido voluntariamente submetidos a novas provas para tentar suportá-las com mais resignação. Entre alguns é uma espécie de apego à matéria do qual procuram em vão se desembaraçar para se elevar para mundos melhores, mas cujo acesso lhes está interditado ; entre a maior parte está o pesar de haver feito uma coisa inútil, pois disso provaram apenas a decepção.

A religião, a moral e todas as filosofias condenam o suicídio como contrário à lei da natureza ; todos nos dizem em princípio que não se tem o direito de voluntariamente abreviar sua própria vida. Mas por que não se tem esse direito ? Por que não se é livre de dar um termo a seus sofrimentos ? Estava reservado ao Espiritismo demonstrar, pelo exemplo daqueles que sucumbiram, que esse ato não seria somente uma falta, uma infração a uma lei moral, consideração de pouco peso para certos indivíduos, mas sim um ato estúpido, já que nada se ganha, longe disso, muito mais se perde ; isso não é a teoria que nos ensina, são os fatos que são colocados sob os nossos olhos.



Vale anotar:



As vicissitudes da vida têm uma causa justa, que pode estar seja na vida presente, seja nas existências passadas.



Para saber mais:



O Livro dos Espíritos Allan Kardec (2ª parte, cap. VI, Escolha das provas)

O Evangelho Segundo o Espiritismo Allan Kardec (cap. V, Bem aventurados os aflitos)

O Livro dos Espíritos Allan Kardec (4ª parte, cap. I, suicida)

O Céu e o Inferno Allan Kardec (2ª parte, cap. V, Suicidas)

CONVERSANDO SOBRE SUICÍDIO.

Desconhecido





Em um mundo onde predomina a valorização do TER em detrimento do SER, onde não há uma idéia bem definida do que esperar depois do fenômeno da morte, o caminho da autodestruição ou seja, do suicídio, parece não apenas aceitável como até mesmo lógico e solucionador, diante de uma perda considerada irreversível.

Em outras culturas, como a dos japoneses, o suicídio é muitas vezes considerado um ato de bravura, como quando os kamikazes direcionaram seus aviões-bomba aos contratorpedeiros americanos em Pearl Harbor, ou um jovem adolescente que se suicida por não ter passado no teste para o 2º grau acreditando ter desonrado o nome e a tradição da sua família, postura essa adotada pela supervalorização da chamada honra que é, como sabemos, filha dileta do orgulho.

O Espiritismo vem, então, esclarecer, trazer luz às reflexões sobre este ato infeliz, que certamente neste instante povoa a atmosfera mental de muitos dos que sofrem em nosso planeta. Basta um de seus Princípios Básicos para apaziguar e trazer um traço de esperança aos corações desamparados: a Pluralidade das Existências, a Reencarnação.

Diante da certeza das vidas sucessivas, o Homem não tem mais o direito de cogitar sobre o impossível, o irreversível, o inatingível. O melhor sempre está por vir. As dificuldades instruem e passam, as virtudes se consolidam e ficam.

No entanto, esta certeza não se adquire como quem decora um texto para um exercício escolar, ou ainda como quem recita uma oração cheia de palavras e vazia de sentimentos. Esta certeza é fruto do raciocínio e do estudo, da vigilância e da perseverança.

A Doutrina dos Espíritos nos traz também a triste notícia daqueles nossos irmãos que pelos mais diversos motivos precipitaram seus processos desencarnatórios: histórias de dor e angústia muitas vezes maiores que as que tinham quando outrora encarnados. A consciência de si mesmo se descortina e esta nudez espiritual é motivo de grandes padecimentos. Diversos irmãos conservam ainda em seus corpos perispirituais as graves conseqüências dos seus atos violentos, que dificultarão deveras as suas próximas oportunidades no mundo material.

Frente a estas verdades incontestes, vamos refletir sobre a nossa própria atitude mental, será que de vez em quando deixamos os nossos pensamentos percorrerem os caminhos da desesperança? Será que nossos comentários algumas vezes pessimistas e outras difamatórios não estão destruindo os sonhos de alguém carente de luz e esclarecimento? Será que a nossa tirania no dia-a-dia para com os desamparados da vida não os está empurrando cada vez mais para o abismo do suicídio?



Reflitamos nisso.

CIRCUSTÂNCIAS REFLEXAS E SUICÍDIO

Waldehir Bezerra de Almeida





Os problemas acompanham o suicida no além-túmulo.



O suicídio, para muitos estudiosos do assunto, está ligado ao campo social e à psicopatologia e estabelecem, como principais causas a ausência de uma perspectiva de vida, impossibilidade de automanutenção, criminalidade, chantagem, vingança, transtornos de humor (depressão, pânico, ansiedade generalizada etc.), consumo abusivo de drogas e álcool. Quando os suicidas deixam cartas justificando seu ato tresloucado, falam de incredulidade nos homens e em Deus, desânimo para enfrentar os desafios da vida e sua falta de sentido, frustração no amor.



O sociólogo Émile Durkheim (1858-1917), estudando os problemas da personalidade, admitiu que o suicídio tem fundamentos em causas sociais e não individuais. Com base em suas pesquisas, caracterizou três tipos de suicidas:



a) suicida egoísta: aquele que se afasta dos outros seres humanos;

b) suicida altruísta: aquela pessoa que se mata por extrema lealdade a uma causa;

c) suicida anômico: aquele para o qual as crenças e os valores sociais perderam todo o sentido.



Não obstante o valor reconhecido das causas acima apontadas, elas não são suficientes para esclarecer plenamente as razões que levam a criatura a interromper sua existência física em ato de total desobediência ao Criador, pois que uma grande parte dos seres humanos que passa por aquelas circunstâncias não comete o suicídio. Professor Allan Kardec interpelou os Espíritos querendo saber de onde nasce o desgosto da vida conduzindo o homem ao suicídio e obteve a seguinte resposta:



- "Efeito da ociosidade, da falta de fé e, também, da saciedade. Para aquele que usa de suas faculdades com fim útil e de acordo com as suas aptidões naturais, o trabalho nada tem de árido e a vida se escoa mais rapidamente. Ele lhe suporta as vicissitudes com tanto mais paciência e resignação, quanto obra com o fito da felicidade mais sólida e mais durável que o espera."1 E o Codificador complementa com a sua sabedoria haurida nas fontes espirituais superiores: "A incredulidade, a simples dúvida sobre o futuro, as idéias materialistas, numa palavra, são os maiores incitantes ao suicídio; ocasionam a covardia moral."2.



Pode-se afirmar, portanto, que a principal causa que leva o homem a cometer tal desatino é o materialismo que faz o homem acreditar que a vida se resume nesta existência, e que sua dor, seja ela física ou moral, cessará com a morte do corpo. O que não é verdade, pois o sofrimento continua no Além-túmulo em forma de tortura.

O Espiritismo, comprovando que o Espírito vive muitas existências pela reencarnação, tem a resposta para muitos desses acontecimentos, estando entre eles a reincidência no auto-aniquilamento, acovardando-se diante da prova que pedira antes de reencarnar. Analisando esse caso, o Mentor Druso cunhou a expressão circunstâncias reflexas para esclarecer que existem situações em que o Espírito no seu processo provacional é tentado a repetir o mesmo erro de outrora. Permita-me o leitor dar aqui alguns esclarecimentos antes de ouvirmos aquele Mentor.

Circunstância é condição de tempo, lugar ou modo que cerca ou acompanha um fato ou uma situação e que lhes é essencial à natureza. É um conjunto de fatores materiais, morais e espirituais que acompanham ou circundam alguém em um determinado momento. Costuma-se dizer que "a ocasião faz o ladrão". Essa ocasião é a circunstância que incita o homem a cometer o furto. Sendo ele moralmente fraco, o cometerá.

Ação reflexa é uma resposta mecânica - involuntária - uniforme e adaptada, do organismo a um estimulo externo ou interno ao próprio organismo. Exemplos: a contração da pupila quando o olho é estimulado pela luz ou a salivação pelo gosto ou pela vista de um alimento. Assim também funciona o nosso psiquismo reagindo positiva ou negativamente frente a um agente indutor. André Luiz cita vários exemplos de agentes da indução que nos levam, muitas vezes a uma ação reflexa: "Uma conversação, essa ou aquela leitura a contemplação de um quadro, a idéia voltada para certo assunto, um espetáculo artístico, uma visita efetuada ou recebida, um conselho ou uma opinião representam agentes de indução, que variam segundo a natureza que lhes é característica, com resultados tanto mais amplos quanto maior se nos faça a fixação mental ao redor deles."3

A circunstância reflexa poderá ser o próprio meio onde o Espírito reencarnou para ser provado na sua má tendência. Ensina Kardec ser necessário que o Espírito ao reencarnar "[...] seja posto num meio onde possa sofrer a prova que pediu. Pois bem! É necessário que haja analogia. Para lutar contra o instinto do roubo, preciso é que se ache em contacto com gente dada à prática de roubar."4

Mas tal circunstância poderá surgir a qualquer momento da nossa nova existência provacional. Tudo estará indo muito bem na vida da criatura, quando, de repente, se encontra ela em meio a uma situação inesperada, contrária a tudo o que até então previra ... É circunstância reflexa a exigir-lhe renúncia, resignação, fé em Deus e paciência ... É o momento da prova máxima que o Espírito na ânsia na¬tural da libertação da consciência solicitou à Misericórdia Divina. Acompanhemos, agora, em resumo, o raciocínio do Mentor Druso.

Um homem comete suicídio aos quarenta anos de idade no corpo físico. Retomando ao mundo espiritual sofre as conseqüências imediatas do seu gesto. Para recompor as células do veículo perispiritual, recebe o prêmio de um corpo carnal devendo passar pela prova extrema da tentação ao suicídio na idade precisa em que o cometera na outra existência. Isso porque - conclui Druso - "[...] as imagens destrutivas, que arquivou em sua mente, se desdobrarão, diante dele, através do fenômeno a que podemos chamar "circunstâncias reflexas", dando azo a recônditos desequilíbrios emocionais que o situarão, logicamente, em contacto com as forças desequilibradas que se lhe ajustam ao temporário modo de ser."5

Diante do que foi dito, não se deve compreender que o Supremo Criador, com sua Lei inexorável, impõe como expiação ao pecador o cometimento do suicídio por ele ter assim agido em outra vida ou ter sido co-responsável pelo suicídio de outrem. Não! Tudo transcorre por efeito lógico de uma causa criada pelo delinqüente à revelia da Lei harmoniosa que rege o Universo. O Espírito que cometera suicídio em outra existência, chega nesta desarmonizado com as Leis divinas, enredado em complexos psíquicos deprimentes e, para se redimir, deverá suportar a tentação da reincidência.

É oportuno lembrar o "não nos deixeis cair em tentações" que Jesus nos pede para repetir na oração Pai Nosso, bem como a imperiosa necessidade de não darmos trégua à nossa reforma íntima, amealhando recursos educativos e renovadores, com ajuda do estudo das coisas divinas e pela prática da fraternidade. Assim, melhores preparados do que chegamos à Terra, com a misericórdia de um novo corpo, estaremos aptos a superar a crise trazida pelas circunstâncias reflexas, não somente para vencer o incitamento ao suicídio, mas também a outros atos contrários às Leis Morais Divinas, que levarão ao encarceramento de nossa consciência.



1 - KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 76. Ed. Rio de Janeiro - RJ: FEB, questão 943. 2 - KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 112. Ed. Rio de janeiro - RJ, capo V, item 16.

3 - XAVIER, Francisco Cândido/VIEIRA, Waldo. Mecanismos da mediunidade. Pelo Espírito André Luiz. 1. ed. especial, Rio de Janeiro - RJ: FEB, 2003, capo 12, p. 92.

4 - KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Edição eletrônica da FEB, questão 260.

5 - XAVIER, Francisco Cândido. Ação e Reação. Pelo Espírito André Luiz. 1. ed. especial, Rio de Janeiro - RJ: FEB, 2003, p. 98-99.



Nota: o autor é professor aposentado e atua no movimento espírita de Brasília-DF.





Artigo publicado na Revista Internacional de Espiritismo - Outubro de 2006

DESGOSTO PELA VIDA: SUICÍDIO

Germano Serafim/Cheyla Toledo Bernardo





Desgosto pela vida - Suicídio



Germano Serafim



O homem não tem o direito de dispor da própria vida, somente Deus tem este direito. Por isso, o suicídio é uma transgressão da lei natural. Portanto, é importante que saibamos que tirar a própria vida é sempre um ato condenável. Porém, Deus, em sua infinita misericórdia, atenua as suas conseqüências, conforme os casos. Assim, o suicídio involuntário não é imputável a seu autor, pois o louco que o comete não sabe o que faz. Em geral, não há culpabilidade numa ação, se não há a intenção ou a perfeita consciência de que se está praticando o mal.

O suicídio voluntário, por sua vez, pode ter por motivação diferentes circunstâncias. Em seguida, algumas delas serão analisadas pelos espíritos.

O suicídio motivado por desgostar da vida é uma insensatez. O desgosto pela vida que se apodera de alguns indivíduos sem motivos aceitáveis é efeito da ociosidade e da falta de fé, que podem ser frutos da saciedade. O ocioso que se suicida deveria ter se dedicado ao trabalho, porque assim a existência não lhe teria sido tão pesada. O trabalho nada tem de árido e a vida se escoa mais rapidamente para quem usa de seus atributos com fins úteis e de acordo com suas aptidões naturais. Quem ocupa seu tempo suporta as contingências da vida com mais paciência e resignação, ao mesmo tempo que trabalha objetivando a felicidade mais sólida e mais durável que o espera na vida futura.

Por sua vez, o suicida que tem por fim escapar às misérias e às decepções deste mundo é um pobre espírito que não teve a coragem de suportá-las. Deus ajuda os que sofrem e não aos que não têm forças nem coragem. As tribulações da vida são provas ou expiações. Felizes serão os que as suportam sem se queixar, porque serão recompensados e, nestes casos, infelizes serão aqueles que, na sua impiedade, esperam para elas uma saída naquilo que chamam de sorte ou acaso. Esta pode favorecê-los por um instante, mas somente para que mais tarde sintam, e de modo cruel, o vazio dessas palavras. Também o homem que luta com a penúria e que não se mata, mas se deixa morrer de desespero, pode até ser considerado um suicida, mas, apesar disso, terá misericórdia. Não será totalmente absolvido, porque lhe faltaram firmeza e perseverança e não usou de toda sua inteligência para sair das dificuldades. Será muito infeliz se a causa de seu desespero tiver sido o orgulho, isto é, se tratar-se de um daqueles homens em quem o orgulho paralisa os recursos da inteligência, que se envergonham de dever sua existência ao trabalho de suas próprias mãos, preferindo morrer de fome a ser rebaixados do que chamam de sua posição social. A propósito, é necessário que entendamos que há muita grandeza e dignidade em se lutar contra a adversidade, em se enfrentar a crítica de um mundo fútil e egoísta, que só tem boa vontade para aqueles a quem nada falta, os quais nos dão as costas quando deles precisamos. Por outro lado, é bom que saibamos que não deixa de ser uma estupidez sacrificar-se a vida em consideração a um mundo como este, porque ele nem se importará com este nosso ato. Para finalizar este parágrafo, ressalte-se que infelizes também serão os que levam um desgraçado a um ato de desespero, porque responderão por isso como por um homicídio. Aquele que causou um suicídio ou que poderia tê-lo evitado, é considerado mais culpado do que o suicida.

Outra motivação para dar cabo à própria vida é a vergonha por uma má ação. Este suicídio é tão reprovável como aquele provocado pelo desespero. Na verdade, este ato não irá apagar a falta e ainda acrescentará outra. Quando se teve a coragem de praticar o mal, deve-se ter também a coragem de sofrer suas conseqüências. Em todos os casos, Deus é quem julga e pode diminuir o rigor de sua justiça, conforme a causa. Assim é que aquele que comete suicídio, tentando com isso impedir que a vergonha envolva os filhos ou a família, não procede bem. Mas, como acredita que sim, Deus levará em conta a sua intenção, porque trata-se de uma expiação que o suicida impôs a si mesmo. Sua intenção atenua a falta, mas nem por isso ele deixa de ser faltoso, porque quem tira a sua vida para fugir à vergonha de uma má ação, prova que dá mais valor à estima dos homens do que à de Deus, uma vez que retorna à vida espiritual carregado de suas iniqüidades, tendo-se privado dos meios de repará-las durante a vida carnal. Mas Deus, que se deixa levar mais que os homens pelas súplicas, freqüentemente perdoa o arrependimento sincero e leva em conta nossos esforços no sentido de reparamos nossos erros. Por sua vez, o suicida, com seu ato, nada repara.

O suicídio motivado pela intenção de se chegar mais depressa a uma vida melhor é um enorme erro, e louco o que pensa ser isso possível. Para atingir com mais certeza seu intento, é muito mais produtivo que viva fazendo o bem. Na verdade, ao suicidar-se, retarda sua entrada num mundo melhor e terá que pedir que lhe seja concedido voltar, para concluir a vida que interrompeu sob a influência de uma falsa idéia. Uma falta, qualquer que ela seja, jamais dá acesso ao santuário dos eleitos.

Renunciar à própria vida com a intenção de salvar a de outrem ou de ser útil aos seus semelhantes é mais que meritório aos olhos de Deus, é sublime. Isto porque nossa vida é o bem terreno a que damos o maior valor e, por isso, desistir dela pelo bem de nossos semelhantes não se caracteriza como suicídio, mas como sacrifício, e todo sacrifício que o homem venha a fazer às custas de sua própria felicidade é resultado da prática da caridade. Todavia, não podemos nos esquecer que Deus se opõe a qualquer sacrifício inútil . Assim, ao sacrificar a própria vida, o homem deve refletir sobre se sua vida não será mais útil do que sua morte. Além do mais, Deus não vê com prazer o sacrifício, se for manchado pelo orgulho. Um sacrifício somente é meritório se for desinteressado, e algumas vezes, aqueles que o praticam, têm uma segunda intenção que diminui o valor de seu ato aos olhos de Deus.

Comete suicídio moral o homem que perece como vítima do abuso de paixões que sabe lhe abreviarão o fim, mas às quais não mais consegue resistir, porque se transformaram, pelo hábito, em verdadeiras necessidades físicas. Entende-se que ele, nesses casos, é duplamente culpado, pois nele há falta de coragem e bestialidade, somadas ao esquecimento de Deus. É mais culpado do que aquele que tira a própria vida por desespero, porque tem tempo de refletir sobre seu ato. Diferentemente de quem é vítima do abuso das paixões, quem comete suicídio num instante de desespero vive numa espécie de delírio que se aproxima da loucura. Por isso, o primeiro, mesmo não tendo dado cabo de sua vida de imediato, será muito mais punido, porque as penas são sempre proporcionais à consciência que se tenha das faltas cometidas.

O suicídio voluntário é um erro mesmo quando uma pessoa vê à sua frente uma morte inevitável e terrível. Não se deve abreviar a vida voluntariamente, ainda que se acredite que ela irá durar apenas por mais alguns instantes. É sempre culpado aquele que não aguarda o termo que Deus estabeleceu para sua existência. Isto porque ninguém pode ter a certeza de que, apesar das aparências, este fim tenha realmente chegado, e que um socorro inesperado não possa vir até o último momento. Em suma, abreviar a vida, mesmo que por um instante, será sempre uma insubmissão e falta de resignação diante da vontade de Deus. A conseqüência de tal ato será sempre uma pena proporcional à gravidade da falta e de acordo com as circunstâncias em que ela foi cometida.

A propósito, sabemos que em alguns países mulheres viúvas costumavam deixar-se queimar sobre os corpos de seus maridos. Elas não podem ser consideradas suicidas, porque obedeciam a um preconceito (ou melhor, tradição), e amiúde o faziam mais porque eram forçadas do que pela livre vontade. Mas, mesmo quando agiam espontaneamente, como julgavam cumprir um dever, seu ato não se caracteriza como suicídio. Por ele não devem ter sofrido as conseqüências como suicidas, pois são desculpáveis pela falta de formação moral e pela ignorância em que se encontravam. Esses usos bárbaros e estúpidos desapareceram com o advento da civilização.

Cometem também enorme erro aquelas pessoas que, não se conformando com a perda de entes queridos, se suicidam na esperança de ir juntar-se a eles na vida futura. O resultado é bastante diverso daquilo que esperavam, pois, ao invés de se unirem àqueles a quem amam, acabam por se afastar ainda mais deles. Assim sucede porque Deus não pode recompensar um ato de covardia e nem o insulto que lhe é lançado por não confiarem em sua providência. Essas pessoas pagarão esse instante de loucura com aflições maiores do que as que pensaram abreviar se matando, e não terão, para compensá-las, a satisfação que esperavam de reverem seus entes queridos.

Finalizando, a observação mostra que as conseqüências do suicídio realmente não são sempre as mesmas. Porém, algumas dessas conseqüências são comuns a todos os casos de morte violenta, isto é, aquela em que acontece a interrupção brusca da vida.

De início observa-se a persistência mais prolongada e firme do laço que une o espírito ao corpo. Isto acontece porque este laço está, quase sempre, na plenitude de sua força no momento em que se parte, ao passo que, quando se trata de morte natural, ele se enfraquece gradualmente e, às vezes, chega até a se desfazer antes de a vida se extinguir totalmente no corpo. As conseqüências advindas desse estado de coisas são o prolongamento da perturbação do espírito, seguida da ilusão que o faz acreditar, por um tempo mais ou menos longo, que ele ainda faz parte do mundo dos vivos.

A afinidade que permanece entre o espírito e o corpo produz, em alguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo sobre o espírito, o qual, contra sua vontade, passa a sentir os efeitos da decomposição, proporcionando-lhe uma sensação plena de angústia e horror. Este estado pode persistir pelo tempo que ainda devia durar a vida que foi interrompida.

Este último efeito não é geral, mas em caso algum o suicida fica livre das conseqüências de sua falta de coragem e, cedo ou tarde, terá que pagar pelo seu erro, de um modo ou outro. Assim é que certos espíritos, informando terem sido muitos infelizes na Terra, esclareceram ser sua desgraça decorrente de um suicídio praticado numa existência anterior e, numa tentativa de suportá-las com maior resignação, haviam se submetido voluntariamente a novas provas.

Em alguns casos de suicídio, nota-se a persistência de uma espécie de apego à matéria, da qual o espírito inutilmente tenta se livrar, a fim de se dirigir a mundos melhores, mas que se tornam inacessíveis a ele. A maior parte dos suicidas sente o remorso por terem praticado um ato inútil, do qual só provam decepções.

A religião, a moral, todas a filosofias condenam o suicídio como contrário à lei natural. Todas nos dizem, em princípio, que não temos o direito de abreviar voluntariamente nossas vidas. Mas por que não nos é dado este direito? Por que não somos livres para pormos um fim em nossos sofrimentos? O Espiritismo pode nos dar a resposta, pois demonstra pelo testemunho dos que sucumbiram pelo suicídio que este ato não se constitui apenas em infração a uma lei moral, consideração que pouco importa a certos indivíduos, mas sim num ato estúpido, pois que nada ganha quem o pratica, muito pelo contrário. Assim sendo, não é através da teoria que isto nos é ensinado, mas sim pelos próprios fatos que os espíritos de suicidas expõem sob nossas vistas.

Concluindo, o suicídio traz para o espírito as mais diversas conseqüências, e para ele não há penas previamente determinadas. Observa-se, contudo, que há uma conseqüência inevitável para todos os casos de suicídio: o desapontamento. No mais, a sorte não é a mesma para todos; depende das circunstâncias, isto é, em todos os casos, as penas correspondem sempre às causas que o motivaram. Alguns expiam sua falta imediatamente, outros em nova existência, que certamente será pior do que aquela cujo curso interromperam.



Publicado no Boletim GEAE Número 408 de 9 de janeiro de 2001







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Desgosto pela vida provoca suicídio.



Cheyla Toledo Bernardo



As causas mais comuns do suicídio, em todos os tempos, são o desgosto pela vida, as depressões, os insucessos amorosos ou financeiros. Algumas pessoas são levadas a esse ato por desespero, outras chegam a premeditar o fim da própria vida. Todos têm como objetivo fugir das dificuldades deste mundo, passando para um mundo melhor ou simplesmente para o nada.

As religiões sempre se pronunciaram contra esse ato, baseadas no fato de que somente Deus tem o direito de tirar qualquer vida, pois é Ele quem a dá.

A Doutrina Espírita, além de concordar com a opinião acima, prova que o nada não existe, que o indivíduo sobrevive ao túmulo, mostrando-se um poderoso antídoto contra o suicídio. A vida além da morte caracteriza-se pela continuação do homem com todas as suas características: moral, inteligência, angústias, problemas, dores, felicidade. A única coisa que o ser deixa na Terra é o corpo e seus bens materiais. Desta forma, ao tentar fugir de um sofrimento através do suicídio, o espírito percebe que, além de nada ter adiantado, ainda perdeu a oportunidade que tinha de conquistar coisas boas enquanto estava no plano terreno.

Em O Livro dos Espíritos, questões 943 a 957, Kardec formula uma série de perguntas sobre o suicídio aos Espíritos da falange da Verdade. Eles esclarecem que aqueles que chegam ao suicídio são levados pela ociosidade, ignorância e pela falta de fé. Em contrapartida, o trabalho e a religiosidade seriam o remédio para aliviar aqueles que sofrem e pensam em libertar-se deste modo.

O suicídio, sendo uma transgressão da Lei Divina (não matarás), traz sempre uma conseqüência dolorosa para quem o comete, que varia segundo as causas e as intenções que o moveram. Entretanto, Kardec cita algumas conseqüências gerais que o espírito enfrenta ao chegar no além pelas vias do suicídio:



957. Quais são, em geral, as conseqüências do suicido sobre o estado do espírito?

"- As conseqüências do suicídio são as mais diversas. Não há penalidades fixadas e em todos os casos elas são sempre relativas às causas que o produziram. Mas uma conseqüência a que o suicida não pode escapar é o desapontamento. De resto, a sorte não é a mesma para todos, dependendo das circunstâncias. Alguns expiam sua falta imediatamente, outros numa prova numa nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam. ...Há, porém, as que são comuns a todos os casos de morte violenta, as que decorrem da interrupção brusca da vida. É primeiro a persistência mais prolongada e mais tenaz do laço que liga o Espírito e o corpo... As conseqüências desse estado de coisas são o prolongamento da perturbação espírita, seguido da ilusão que, durante um tempo mais ou menos longo, faz o Espírito acreditar que ainda se encontra no número dos vivos. A afinidade que persiste entre o Espírito e o corpo produz, em alguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo sobre o Espírito, que assim ressente, malgrado seu, os efeitos da decomposição, experimentando uma sensação cheia de angústias e horror... Esse efeito não é geral; mas em alguns casos o suicida não se livra das conseqüências da sua falta de coragem e cedo ou tarde expia essa falta.